O Estado de São Paulo (2020-05-12)

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A10 TERÇA-FEIRA, 12 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


João Prata
Priscila Mengue


O novo rodízio de veículos
que entrou em vigor ontem re-
duziu o trânsito na cidade de
São Paulo e aumentou a pro-
cura pelo transporte público.
O pico de congestionamento
pela manhã foi de 1 quilôme-
tro, segundo a Companhia de
Engenharia de Tráfego
(CET), mas no metrô e nos
trens da CPTM o movimento
cresceu de 11% a 15%, depen-
dendo da região, segundo o se-
cretário estadual de Trans-
portes Metropolitanos, Ale-
xandre Baldy.
O pico de 1 quilômetro foi às
8h30, enquanto há uma semana
se relataram 11. Em relação à len-
tidão, o pico nesta segunda foi
de 4 quilômetros, às 8 horas, en-
quanto que na semana passada
foram registrados 21 no mesmo
horário – pelos dados do Waze.
No metrô, Baldy disse à Rádio
Eldorado que a alta de passagei-
ros foi de até 12% em estações
das Linhas 1, 2 e 3, de até 14% na
4-Amarela e de até 11% na 5-Li-
lás. Na CPTM, foi constatado
um aumento de até 15% na de-
manda média de usuários para


o pico da manhã.
Segundo a assessoria da Se-
cretaria dos Transportes Metro-
politanos, esse aumento já era
esperado e a oferta de trens esta-
va ajustada para evitar aglome-
rações. À Rádio Eldorado, Baldy
afirmou que a frota de trens é
suficiente e poderá ser amplia-
da em caso de necessidade.
Também houve reforço na fro-
ta de ônibus na cidade. A SP-
Trans informou que até as 9 ho-
ras foram utilizados 489 dos
600 ônibus de “reserva”.
No período da tarde, para se
ter ideia, o pico foi de 8 quilôme-
tros às 13 horas na segunda-fei-
ra anterior. Já ontem o pico de
lentidão no primeiro dia do no-
vo rodízio foi de 4 quilômetros,
às 14h e 18h30. Uma semana
atrás, o geral havia sido de 11, às
12h30. Com o novo rodízio, a
Prefeitura quer tirar 50% da fro-
ta das ruas. A medida tem por
objetivo aumentar o isolamen-
to social e vale para toda a cida-
de, o dia todo, incluindo fins de
semana. Nos dias pares, circu-
lam placas de final par (0,2,4,6 e
8). E nos dias ímpares, as placas
de final ímpar (1,3,5,7 e 9).
A capital paulista concentra o
maior número de mortes e ca-

sos de coronavírus no Brasil.
Em balanço divulgado pela Se-
cretaria Estadual da Saúde no
domingo, São Paulo registrava
46.131 casos confirmados e
3.7743 mortes. Na capital, eram
27.771 casos, com 2.281 mortes.
Na semana passada, a taxa de
isolamento social na cidade fi-
cou abaixo de 50%. A meta é che-
gar aos 60% de isolamento – o
ideal para evitar o colapso do
sistema de saúde é de 70%.
Estão excluídos do rodízio
carros da polícia, do Exército,
prestadores de serviço de rede
elétrica e de gás, e também veí-
culos da área da saúde. Os pro-
fissionais de saúde devem fazer
um cadastro na Prefeitura para
ficarem fora da restrição.
O cadastro terá de ser feito
nesta semana, por meio de en-
vio de dados como CPF, nome,
estabelecimento em que traba-
lha o profissional e a placa do
veículo. As multas que forem
aplicadas nos próximos dez
dias a esses profissionais serão
descartadas posteriormente.
Os profissionais podem tam-
bém enviar por e-mail, para o
endereço eletrônico: isen-
cao.covid19@prefeitu-
ra.sp.gov.br.

Os veículos de pessoas com
deficiência, condutoras ou não
condutoras, que já têm autoriza-
ção da Prefeitura e estão isen-
tos do rodízio de carros na cida-
de de São Paulo, continuam libe-
rados para circulação em qual-
quer dia. Táxis e motos estão
liberados da medida, mas car-
ros de aplicativo só poderão cir-
cular nos dias em que a placa do
veículo for permitida. Haverá
também o retorno da restrição
à circulação de caminhões em
São Paulo, exceto os das áreas

de abastecimento e saúde.

Pedido de suspensão. Desde
quinta-feira, o novo rodízio é al-
vo de um pedido de suspensão
feito pelo vereador Fernando
Holiday (Patriota) contra a de-
cisão da Prefeitura de ampliar a
restrição aos veículos. Ontem,
o Ministério Público Estadual
(MPE) deu parecer favorável à
suspensão do rodízio, embora
discorde dos argumentos apre-
sentados pelo vereador.
“Os questionamentos foram
feitos, pois é intuitivo que a reto-
mada do sistema de rodízio,
sem estudos técnicos a ampa-
rar a medida, pode gerar refle-
xos negativos, inclusive para o
próprio combate à pandemia”,
diz o parecer apresentado pelo
MP-SP à Justiça. “Sem estudos
técnicos e planejamento que ga-
rantam os benefícios efetivos
da medida, poderá provocar
efeito contrário, isto é: a super-
lotação no transporte público
coletivo e, consequentemente,
uma maior propagação do novo
coronavírus.” Questionada, a
Prefeitura não respondeu aos
questionamentos até as 21h30. /
COLABORARAM BRUNO RIBEIRO E
TULIO KRUSE

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Terrence McCoy
THE WASHINGTON POST


Na Europa, os parques estão
sendo reabertos e as pessoas
voltando às ruas. A Austrália
anunciou planos para retomar
o turismo. As restrições come-
çam a ser flexibilizadas nos Esta-


dos Unidos. Mas se grande par-
te do mundo negocia as condi-
ções para uma reabertura, o Bra-
sil, que registrou mais de 11 mil
mortes e se tornou o mais recen-
te foco do coronavírus, ainda
não encontrou uma maneira de
estabelecer um lockdown.
Nos centros urbanos dura-
mente atingidos, como o Rio de
Janeiro, as pessoas ainda se
amontoam nas ruas. As calça-
das à beira-mar continuam re-
pletas de banhistas. O presiden-
te Jair Bolsonaro persiste em
minimizar a ameaça, tendo de-
clarado na semana passada que

faria um churrasco no fim da se-
mana. Após a forte reação con-
trária, decidiu passear de jet ski.
Em lugar de unir o país contra
uma ameaça comum, a respos-
ta à pandemia vem dividindo
ainda mais uma sociedade pro-
fundamente polarizada. Bolso-
naro, cuja tendência é não fazer
nada, transferiu a tarefa para os
governadores, que passaram a
responsabilidade de implemen-
tar as medidas mais rigorosas
para as municipalidades. O re-
sultado é uma agregação de me-
didas conflitantes e contraditó-
rias que mudam não só de Esta-

do e município, mas também de
bairro para bairro.
Algumas cidades do Nordes-
te e Norte, onde o sistema de
saúde é particularmente precá-
rio, começaram a estabelecer
lockdown. Mas outras vêm re-
tardando a medida o máximo
possível – ou lutando para con-
seguir o apoio da população.
Em áreas de São Paulo, o Esta-
do mais severamente atingido
pela epidemia, menos de 50%
das pessoas obedecem às deter-
minações de isolamento emiti-
das pelas autoridades. Outro fa-
to que complica mais a situação

é a pobreza. Quase 40% da popu-
lação são pessoas que traba-
lham informalmente e os gover-
nos têm feito pouco para aten-
der às necessidades delas. À me-

dida que o número de casos e
mortes dispara, os pesquisado-
res alertam que, se o Brasil não
adotar medidas mais duras e
não impuser um lockdown lo-
go, será um desastre. O sistema
médico brasileiro, considerado
o mais consistente da América
Latina, já está próximo do seu
limite. “Não podemos suportar
todo mundo”, disse Rodrigo Ro-
mano, que trabalha em um hos-
pital em Manaus, que registra
uma das mais altas taxas de mor-
te pelo coronavírus do país. Ele
diz que não consegue acreditar
no que vê diariamente nas ruas.
“As pessoas não têm bom sen-
so, andam pelas ruas, nos ôni-
bus. É gente para todo lado.” /
TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Especialistas


sugerem o que


pode melhorar


Metrópole


lO Brasil registrou 396 óbitos
nas últimas 24 horas e acumula
11.519 vítimas pela covid-19, se-
gundo balanço divulgado nesta
segunda-feira pelo Ministério da
Saúde. No mesmo intervalo, o
País somou 5.632 novos casos,
chegando à soma de 168.331 in-
fectados. Deste total, 69.232 pes-
soas estão curados e 82.344 con-
tinuam em acompanhamento. /
JULIA LINDNER

Rodízio reduz trânsito, mas transporte


público tem maior procura em São Paulo


Pernambuco também decreta bloqueio total. Pág. A11 }


lQueixa

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A efetividade do novo rodízio
na cidade de São Paulo passa pe-
lo acompanhamento rígido dos
impactos. É essa a sugestão do
professor do Departamento de
Engenharia de Transporte da
USP, o engenheiro Claudio Bar-
bieri. Ele pondera que a determi-
nação municipal ocorreu de for-
ma rápida por causa da pande-
mia, mas ressalta ser necessária
uma avaliação diária. “Entendo
que (a decisão) teve de ser toma-
da rapidamente, sem um estu-
do e avaliação. À medida que o
poder público possa ir avalian-
do, pode ir ajustando a algum
modelo que traga o efeito neces-
sário’’, disse.
O especialista evita defender
ou criticar a medida em si, mas
levanta pontos que deveriam
ter a efetividade e a necessidade
analisadas e, se necessário,
adaptadas. Um exemplo é a ex-
tensão do rodízio para 24 horas
diárias e todos os dias da sema-
na, o que atinge deslocamentos
durante a noite e a madrugada,
e o impacto para trabalhadores
de comércios e de serviços es-
senciais.
Barbieri sugere que a gestão
municipal amplie as análises de
trajetos na cidade, para enten-
der se os deslocamentos em de-
terminadas regiões são de ativi-
dades não essenciais. Isso ocor-
reria a partir de dados coletivos
e de forma anônima, com infor-
mações de radares, por exem-
plo, e poderia orientar medidas
específicas para as necessida-
des de determinadas regiões.
Já a urbanista Silvana Zioni,
professora de Planejamento
Territorial da UFABC, acredita
que seria mais efetivo atuar na
motivação do deslocamento,
como, por exemplo, ao restrin-
gir a variedade de atividades per-
mitidas. “O rodízio se aplica,
em geral, em casos extremos de
congestionamento, como uma
medida de tentar controlar a de-
manda, ou, como originalmen-
te foi adotado em São Paulo, pa-
ra conter a poluição.”
A professora pondera, tam-
bém, que esse tipo de medida
costuma criar aumento de de-
manda pelo transporte coleti-
vo, que precisa ter incremento.
“Precisa ter uma estimativa de
quem são esses trabalhadores
essenciais, como se deslocam,
reforçar algumas linhas em que
esses serviços são demanda-
dos’’, defende Zioni. / P.M.

Mais 396 mortes


são registradas


FELIPE RAU/ESTADÃO

No primeiro dia da medida adotada pela Prefeitura para diminuir a circulação de veículos e aumentar a taxa de isolamento social na


capital, ruas e avenidas registraram pequeno índice de congestionamento, mas Metrô e CPTM observaram fluxo maior de pessoas


Calmaria. Tráfego de veículos em vias de grande circulação, como a Marginal do Pinheiros, foi bem abaixo do normal ontem, no primeiro dia do novo rodízio


“Não podemos suportar
todo mundo. As pessoas
não têm bom senso, andam
pelas ruas, nos ônibus. É
gente para todo lado.”
Rodrigo Romano
FUNCIONÁRIO DE HOSPITAL EM MANAUS

Outros começam a abrir, e Brasil não sabe como fechar


Em lugar de unir o País


contra uma ameaça


comum, a resposta à


pandemia vem dividindo


ainda mais a sociedade

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