O Estado de São Paulo (2020-05-23)

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O ESTADO DE S. PAULO SÁBADO, 23 DE MAIO DE 2020 Política A


Escalada

Pedro Venceslau
Paula Reverbel

E


leita com 76.306 vo-
tos em 2018 na esteira
do antipetismo e do
bolsonarismo, a deputada fe-
deral Carla Zambelli (PSL-
SP) tem se tornado uma es-
pécie de auxiliar informal do
governo em momentos de
crise e esteve no centro de
dois eventos recentes e capi-
tais para o Planalto: a saída
de Sérgio Moro do Ministé-
rio da Justiça e da atriz Regi-
na Duarte da Secretaria Espe-
cial da Cultura.
Após a troca de mensagens
com Moro, na qual a deputa-

da procurou evitar a saída do ex-
juiz e sugeriu que ele teria uma
vaga garantida no Supremo Tri-
bunal Federal – diálogo incluído
no inquérito que apura se Bolso-
naro tentou interferir na Polícia
Federal –, Carla Zambelli assu-
miu a missão de resolver a crise
com Regina Duarte, de quem
tornou-se amiga e conselheira.
Bolsonaro pediu à deputada
que encontrasse uma saída hon-
rosa para a atriz: “Veja o que po-
de fazer para deixar a Regina fe-
liz. Ela deixou a Rede Globo e
me sinto responsável”, disse o
presidente, segundo ela. Carla
então ficou de marcar um café
da manhã de Regina com Bolso-
naro para apaziguar os ânimos.

Foi de Carla Zambelli a suges-
tão de oferecer à atriz o coman-
do da Cinemateca. O protago-
nismo da deputada no caso vi-
rou foco de reclamação no en-
torno do presidente: após o epi-
sódio, recebeu mensagens que
a aconselhavam a sair dos holo-
fotes. Mas também houve ou-
tras de apoio, conta.
Sobre o episódio com Moro,
Carla disse que tomou a iniciati-
va de procurá-lo após falar com

o chefe da Secretaria de Comu-
nicação, Fabio Wajngarten, e o
ministro da Secretaria de Go-
verno, Luiz Eduardo Ramos,
mas alegou que não consultou
Bolsonaro. “Se eu tivesse falado
direto com o presidente, não te-
ria pedido para o Moro ficar. Eu
estava com os olhos vidrados
no juiz da Lava Jato, mas Moro
tinha uma agenda desarmamen-
tista. O presidente não fazia
questão de que ele ficasse”, dis-

se Carla ao Estadão. Ainda se-
gundo a deputada, a admiração
pelo juiz da Lava Jato – que foi
um dos padrinhos de seu casa-
mento, em fevereiro – foi “subs-
tituída por decepção”.
Segundo a parlamentar, a
aproximação dela com Bolsona-
ro se deu após o rompimento da
também deputada Joice Hassel-
mann (PSL-SP) com o governo.
Segundo Carla Zambelli, Joice a
“bloqueava” do contato com

Bolsonaro e fazia intrigas.
“Bolsonaro ficou quatro me-
ses sem falar comigo na cam-
panha por causa da Joice,
que inventou mentiras de
que eu usava drogas e teria
feito um aborto.”
As duas foram amigas e par-
ticiparam juntas do movi-
mento pelo impeachment de
Dilma Rousseff (PT). Foi Car-
la Zambelli quem abriu espa-
ço para Joice no carro de som
do grupo Nas Ruas, o que aju-
dou a projetar a jornalista
nos grupos de direita.
“Quem a trouxe para os movi-
mentos de rua fui eu.”
“O Bolsonaro nunca gos-
tou da Carla Zambelli. Ele
chegou a mandar a Carla des-
cer de um trio elétrico. Ele
dizia: ‘Tire essa mulher de
perto de mim’. Eu não tive
nada a ver com isso”, disse
Joice ao Estadão. Procura-
da, a assessoria do Planalto
não se manifestou.
Carla Zambelli era gerente
de projetos da KPMG em São
Paulo quando tornou-se líder
do movimento Nas Ruas. Em
2013, conta ela, sua irmã, Pau-
la Zambelli, assinou um mani-
festo do Mackenzie contra
Bolsonaro. O presidente, de-
pois, chegou a questioná-la. À
irmã, disse: “Use outro sobre-
nome ou vou para o embate
com você”. Ela conta que o
pedido foi acatado. “Minha ir-
mã é de centro-esquerda.”

Fiel ao presidente, deputada tem ajudado
o mandatário a contornar crises no governo

Leonardo Augusto
ESPECIAL PARA O ESTADO
BELO HORIZONTE


O ex-governador de Minas Ge-
rais Fernando Pimentel (PT) e
seu ex-secretário da Fazenda,
José Afonso Bicalho Beltrão da
Silva, foram indiciados por pe-


culato e desvio pela Polícia Ci-
vil do Estado. Eles são acusados
de não repassar descontos de
crédito consignado na folha de
pagamento de servidores públi-
cos às instituições financeiras.
Pimentel governou o Minas de
2015 a 2018. Segundo as investi-
gações, o valor total não repas-

sado foi de R$ 924 milhões, em
operações envolvendo pelo me-
nos 280 mil servidores.
As denúncias sobre a reten-
ção dos recursos começaram a
surgir no final de 2017, por par-
te de sindicatos. Servidores tive-
ram os nomes enviados ao servi-
ço de proteção ao crédito.

O governo Pimentel foi mar-
cado por grave crise econômi-
ca. O delegado responsável pe-
lo inquérito, Gabriel Ciriaco
Fonseca, afirmou ter ficado
constatado que o governador e
o secretário imputaram a falta
do repasse dos recursos à crise
financeira. “Mas temos em deci-

sões judiciais que essa questão
envolvendo empréstimos con-
signados não se trata de verba
pública, que pode ser afetada
por crise financeira.” Segundo
ele, do total não repassado, cer-
ca de R$ 500 milhões só foram
pagos pelo atual governo.
Pimentel disse, em nota, que
não conhece o inquérito e se-
quer foi ouvido. “E, o que é mais
absurdo, estou sabendo disso
pela imprensa. Infelizmente, es-

sa prática se tornou corriqueira
no País, o que certamente deve
contribuir muito para o fenôme-
no definido pelos cientistas po-
líticos como ‘criminalização da
política’. Levou o Brasil à triste
situação de hoje: elegeu-se um
presidente que opera aberta-
mente contra o Estado Demo-
crático de Direito.’’ A reporta-
gem não localizou Bicalho.
A pena por peculato é de dois
a 12 anos de prisão.

CARLA


ZAMBELLI, A


‘FAZ-TUDO’ DE


BOLSONARO


Pimentel é indiciado por peculato e desvio


GABRIELA BILO/ESTADÃO

Alinhamento. Carla diz que aproximação com presidente veio após rompimento com Joice
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