O Estado de São Paulo (2020-05-25)

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B6 Economia SEGUNDA-FEIRA, 25 DE MAIO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


A


s previsões dos efeitos da crise
sanitária sobre a economia são
terríveis. Dois economistas da
EPGE/FGV, Johann Soares e Matheus
Rabelo de Souza, publicaram um estudo
intitulado “A macroeconomia das epide-
mias: resultados para o Brasil”. O traba-
lho buscou medir o impacto das medi-
das de contenção social na economia
brasileira no curto e longo prazos.
Esse estudo mostrou que, se o Brasil
adotasse uma contenção social ótima,
seriam evitadas a morte de 50 mil pes-
soas, mas produziria uma recessão no
curto prazo 3,5 vezes pior do que se não
houvesse contenção alguma. Por outro
lado, a contração do PIB seria menor,
pois o número de horas trabalhadas cai-
ria menos. Em resumo, segundo o estu-
do, maior contenção social, menos pes-
soas perdem a vida e menor o impacto
negativo sobre o PIB.
O fato é que não sabemos o que tere-
mos pela frente. Com certeza vamos pas-
sar por uma situação bem difícil na eco-
nomia nos próximos anos. Mas, indepen-
dentemente de qualquer modelo econô-
mico, a discussão é mais ampla e deve
ser conduzida pela ética. A vida deve ser
privilegiada em qualquer situação.
Por outro lado, mesmo não tendo cer-
teza sobre o futuro no curto prazo, sabe-
mos que a situação é trágica. Asim, logo
que a pandemia começou a nos atingir,
além das medidas de combate à doença,
foram anunciadas medidas para tentar
amenizar o potencial do caos econômi-
co trazido pela crise na saúde. O auxílio
emergencial de R$ 600 para as pessoas e
linhas de crédito para as empresas.
Todos sabíamos que fazer esses recur-
sos chegarem até os necessitados seria
um desafio enorme. O que nós estamos
assistindo mostra nossa incapacidade
de resolver problemas. Calcula-se que
em torno de 7,5 milhões de pessoas não
receberão essa renda por não terem
acesso a internet. Isso significa que mi-
lhões de famílias não terão o que comer.
Como consequência, voltaremos a figu-
rar no Mapa da Fome no Mundo, segun-
do o representante do Programa Mun-
dial de Alimentos da ONU. Desde 2014,
estávamos no grupo de países em que
menos de 5% da população vivia insegu-
rança alimentar. Até o fim de 2020, deve-
remos atingir 7,5% da população no gru-
po de extrema pobreza, são quase 15 mi-
lhões de pessoas que ganham menos de
US$ 1,90 por dia. No mundo, hoje, são
mais de 820 milhões de pessoas com in-
segurança alimentar, mas são 135 mi-
lhões que realmente passam fome, nú-
mero que deve dobrar como consequên-
cia da pandemia.
Não podemos tratar esses dados ape-
nas como números, mas, sim, entender-
mos que são pessoas que precisam de
toda a ajuda para sobreviverem, o que
exige mais esforço, cooperação, inteli-
gência e criatividade.

]
PROFESSOR DE FINANÇAS NA FGV/EAESP

Thiago Lasco


“Onde investir seu dinheiro”
é uma frase que combina
mais com as resoluções de
ano-novo. No entanto, neste
momento desafiador, marca-
do por pandemia e um novo
patamar de juros no Brasil, es-
sa dúvida parece mais recor-
rente, juntamente com outra:
“Qual é o melhor investimen-
to para 2020?”.
Definir onde aplicar o pró-
prio dinheiro anda é mais com-
plicado. De um lado, a taxa bási-
ca Selic já foi tão achatada que o
retorno real das aplicações
mais seguras se tornou pífio. De
outro, o nível de volatilidade
dos investimentos que remune-
ram melhor é um obstáculo pa-
ra muitas pessoas que têm pou-
co estômago para oscilações.
E quem se anima a correr ris-
cos em tempos tão incertos,
com os efeitos do novo corona-
vírus ameaçando empresas, em-
pregos e, acima de tudo, pes-
soas?
Para tentar dar um norte que
possa orientar suas próximas
decisões financeiras, conversa-
mos com alguns especialistas e
perguntamos quais investimen-
tos eles consideram ainda váli-
dos para este ano.


Não tente fugir dela. Com a Se-
lic na mínima histórica de 3%
ao ano, de todos os lados come-
çaram a atirar pedras na renda
fixa – que, de fato, teve a renta-
bilidade muito comprometi-
da. Mas muitos investidores
que tentaram fugir dela em
busca de ganhos melhores per-
ceberam, da pior maneira, que
não estavam preparados para
correr riscos maiores.
A boa notícia é que, com os
riscos do cenário econômico
elevados pela instabilidade po-
lítica, os CDBs pós-fixados, que
eram os patinhos feios de on-
tem, agora começam a oferecer
taxas melhores.
“Títulos com vencimento em
dois anos, que há dois meses pa-
gavam entre 115% e 120% do
CDI, agora entregam de 135% a
140% do CDI”, diz Rodrigo Moli-
terno, sócio da Veedha Investi-
mentos. “São excelentes taxas
e o risco é baixo, já que existe o
respaldo do Fundo Garantidor
de Crédito (FGC).”
Títulos públicos continuam
sendo outras opções na seara
mais conservadora, mas os es-
pecialistas divergem nas reco-
mendações. Mario Kepler, só-
cio da Portofino, indica a
NTN-b, também conhecida co-
mo Tesouro IPCA, que paga a
inflação, mais um cupom de ju-
ros. Já Moliterno entende que
os títulos pós-fixados são mais
seguros.
“A NTN-b foi uma vedete,
mas hoje pode jogar contra. O
vencimento é longo, e quanto
menor a Selic de hoje, maior a

expectativa de que ela aumen-
te. Isso pode levar o investidor
a perder dinheiro em uma ven-
da antecipada”, ele pondera.

A bola da vez. Com empresas
precisando captar recursos pa-
ra enfrentar a crise, não é de se
admirar que o crédito privado
venha se destacando como
uma das modalidades que en-
tregam melhores retornos nes-
te momento. É possível em-
prestar dinheiro a essas empre-
sas por meio de títulos priva-
dos como debêntures, CRIs e
CRAs.
“Agora que a taxa Selic está
tão baixa, é na parte de crédito
privado que se encontram as
oportunidades mais interessan-
tes. Muitas empresas grandes,
com classificação de risco
‘AAA’, tiveram grandes distor-
ções e estão pagando taxas mui-
to mais atrativas que no perío-
do pré-crise”, afirma Erick
Scott Hood, gestor da Guide In-
vestimentos. “São papéis de

qualidade.”
A boa perspectiva de retorno
anima o gestor da Guide a reco-
mendar esses títulos até mes-
mo para os investidores conser-
vadores. Mas vale lembrar que
sempre existe o risco de crédi-
to, caso a empresa não honre
com suas obrigações, e nesse ca-
so o investidor não conta com a
proteção do FGC.

Deixando as emoções de lado.
Nesse cenário de estresse, a re-
comendação de Luís Bento, da
Rio Bravo, são os fundos siste-
máticos ou quantitativos. Nes-
ses fundos, as operações de
compra e venda de ativos não
são realizadas por gestores, e
sim por algoritmos.
“As pessoas ficam receosas
porque não há um gestor res-
ponsável para dar a cara a tapa.
Por outro lado, enquanto um
gestor sabe muito sobre 10, 20,
30 empresas, um algoritmo con-
segue analisar milhares ao mes-
mo tempo”, diz Bento.
Outra vantagem da gestão
computadorizada, de acordo
com Bento, é a ausência de viés
na tomada de decisão. Enquan-
to gestores podem sucumbir
ao efeito manada em momen-
tos de pânico no mercado, nos
fundos quantitativos as aloca-
ções seguem regras claras que
valem para todos os cenários.
“A volatilidade não é necessa-
riamente baixa, mas controla-
da. Não existem aquelas explo-
sões que fazem o investidor per-
der dinheiro”, diz o analista da
Rio Bravo.

Saiba como ajustar os


ativos da sua carteira


após a pandemia


mudar o cenário


de curto e médio prazo


O desafio de encontrar bons investimentos


]
FÁBIO GALLO

lOpção ruim 140%
do CDI é quanto
títulos com ven-
cimento em dois
anos estão pa-
gando; há dois
meses pagavam
entre 115% e
120%

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lDe olho

Um retrato da fome


RAPHAEL RIBEIRO/BCB – 19/3/

“A NTN-b foi uma
vedete, mas hoje pode
jogar contra. O vencimento
é longo, e quanto menor a
Selic de hoje, maior a
expectativa de que ela
aumente. Isso pode
levar o investidor a perder
dinheiro em uma venda
antecipada.”
Rodrigo Moliterno
SÓCIO DA VEEDHA INVESTIMENTOS

Selic. Com taxa de juros, determinada pelo Comitê de Política Monetária do BC, em mínima histórica, retorno de aplicações seguras caiu


“É no crédito
privado
onde estão
as melhores
chances.”
Erick Stood
Hood
GESTOR DA
GUIDE
INVESTIMENTOS
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