O Estado de São Paulo (2020-06-01)

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A10 Metrópole SEGUNDA-FEIRA, 1 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Tiago Queiroz
TEXTO e FOTOS

D


esde o dia 7 de maio o
uso de máscaras pas-
sou a ser obrigatório
pelas ruas de todo o Estado
de São Paulo. De item opcio-
nal na luta contra o contágio
do novo coronavírus, todos
passaram a precisar utilizá-
las após decreto do governa-
dor João Doria (PSDB).
A maioria das máscaras, tal
qual os carros na cidade, se-
gue um padrão discreto no
rosto daqueles que por um
motivo ou outro precisam
sair às ruas – de cores preta,
branca ou azul marinho, com-
binam sem alarde com o tra-
dicional cinza paulistano. Al-
gumas, no entanto, fogem
dessa regra monocromática
e chamam a atenção pela for-
ma como combinam com o
restante da roupa ou pelo ca-
rinho com o qual foram esco-
lhidas. A reportagem do Es-
tadão ouviu algumas histó-
rias sobre como foram feitas,
compradas ou obtidas. En-
fim, quais são os motivos das
estampas e outros detalhes a
respeito desse inusitado
item do vestuário que, ao que
tudo indica. veio para ficar.

Vestindo jaqueta verde mili-
tar, boné estampado e óculos es-
curos, o haitiano Edwigt Espe-
ra, de 33 anos, os últimos sete
morando no Brasil, compunha
o modelo “street wear de sobre-
vivência das ruas do pós-nor-
mal” com seu pano preto de es-
tampa branca amarrado no ros-
to. “O uso das bandanas é mui-
to comum no meu país, são fá-
ceis de achar, baratas e muito
simples de usar”, resumiu ele,
antes de sumir pelas alamedas
grafitadas da Vila Madalena.
Em seguida, surge o desem-
pregado Marcio de Oliveira Sou-
za, de 50 anos. “Era inspetor de
alunos de uma faculdade em Hi-
gienópolis e fui demitido em ja-
neiro desse ano. As coisas já não
estavam fáceis antes desse ví-
rus aparecer, imagine agora”,
completa. Vestia uma máscara
camuflada preta, branca e cin-
za, que ganhou da esposa. As
mulheres, aliás, parecem mes-
mo ser as grandes provedoras
de máscaras dos parceiros, na-
morados, maridos e filhos.
A printer Milena de Oliveira,
27 anos, que exerce seu traba-
lho de designer em um ateliê de
impressão, que o diga. Com o
parceiro, o tatuador Jefferson
Torquato, de 31 anos, exibiam
intrigante máscara de pano

com estampas de motivos tropi-
cais. “Fiz essas duas máscaras a
partir de uma ecobag antiga que
tinha produzido. Ela estava em
casa, cortei o pano, costurei, co-
loquei os elásticos. O desenho
fui eu que fiz também.”
Para combinar com a másca-
ra artesanal, os dois vestiam
um clássico das ruas paulista-
nas: calça de sarja preta e cami-
seta branca.
Mas toda regra tem uma exce-
ção e, nesse caso, isso foi atesta-
do pela história da professora
aposentada Selma Bitelli, de 62
anos, fotografada com uma más-
cara azul clara com desenhos
discretos de coroas portugue-
sas, formando um elegante de-
gradê com sua camiseta estam-
pada de pássaro. “Ganhei mi-
nha máscara do meu filho”, re-
sumiu orgulhosa.
No Largo da Batata, caminha-
va a elegante corretora de imó-
veis Jucilene de Jesus Cintra,
de 43 anos. Sua máscara rosa
ornava altiva com uma camise-
ta de mesma cor, casaquinho
branco realçando as cores vi-
vas da composição. “Você está
focalizando na foto a minha ca-
misa também? Escolhi porque
combina com a cor da máscara,
percebeu? O turbante eu colo-
quei porque meu cabelo está
muito grande e sem corte, des-
se jeito dou uma disfarçada”,
dispara. A máscara foi compra-
da com outras que adquiriu de
um costureiro boliviano, em
uma rua paralela ao largo.
No semáforo em direção à
Marginal do Pinheiros, o moto-
boy Rafael Vicente, de 36 anos,
aguardava o verde do sinal para
seguir apressado e vencer o ví-
rus, a crise e as contas que não
param de chegar, tudo isso no
entanto, sem esquecer o bom
humor, evidente na máscara
comprada no Brás. O apetrecho
exibia uma estampa com o deta-
lhe de um clássico das tardes de
tantas gerações, o bigode do
Seu Madruga, personagem do
seriado mexicano Chaves.

Na ciclovia da Faria Lima
transitava com sua insepará-
vel bike Fábio Tenório, de 40
anos. Ele trabalha numa bici-
cletaria próxima à Faria Li-
ma e usa todo dia o veículo de
duas rodas para se transpor-
tar pela cidade.
Adivinhem a máscara – no
seu caso uma bandana – que
usava? Um pano cinza com
multicoloridas bicicletas.
“Já tenho essa bandana faz
uns dois anos e já a usava pa-
ra me proteger do frio. As
orelhas, principalmente.
Agora, claro, passei a usar
mais”, afirma.
As estampas temáticas não
param de aparecer pela Ave-
nida Faria Lima. A bancária
Daniella Souza, de 27 anos,
exibia caveiras mexicanas.
“Adoro esses desenhos, mi-
nha mãe achou esse modelo
e me deu de presente”, disse,
antes de entrar apressada no
banco.
O designer Alessandro
Pontes, de 44 anos, comprou
por meio de uma rede social
uma máscara com divertidos
desenhos de cães. “Pesquisei
alguns lugares que estavam
vendendo máscaras que fu-
giam um pouco do comum
até achar essas.” A advogada
Renata Leuzzi, de 35 anos,
vestia uma com motivos flo-
rais comprada de “umas me-
ninas que vendiam na frente
do Pão de Açúcar da Gabriel
Monteiro da Silva”.
Por fim, os últimos fotogra-
fados foram o motorista de
aplicativos José Augusto Fa-
ria, de 44 anos, com seu filho
o pequeno Gabriel, de 4
anos. Eles exibiam as tais
máscaras discretas, mas a fo-
fura do pequeno Gabriel cha-
mou a atenção da reporta-
gem e rendeu um belo retra-
to de pai e filho. Uma cena
que nos mostra que a delica-
deza e a alegria estão sempre
presentes, mesmo em mo-
mentos difíceis como esse.

PORTA-RETRATOS

Isso é SP. Haitiano Edwigt Espera
está acostumado com bandana;
Jessica Nakano comprou item em ateliê

Estilos diferentes. Ciclista Fabio Tenório não
poderia escolher outra estampa. Professora
Selma ganhou a máscara que usava do filho

Pensado.
Jucilene
combinou
a peça

Pai e filho.
José
e Gabriel
posam
de branco

Humor.
‘Seu
Madruga’
na luta
diária

Cotidiano.
Renata
optou
pelas
flores

UM NOVO


ACESSÓRIO


DA MODA: AS


MÁSCARAS


Máscaras ganham apelo ‘fashion’ diante da nova
rotina que obriga o uso do item nas ruas de SP
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