O Estado de São Paulo (2020-06-05)

(Antfer) #1

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B6 Economia SEXTA-FEIRA, 5 DE JUNHO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


realização_

Uma gaveta


nunca vai aprender


que altruísmo


se escreve com “L”


eacentoagudo.


Masumestudante


da rede pública vai.


monkey-land

aquele smartphone, tablet ou notebook
que está esquecido na sua gaveta para uma criança

da rede pública estudar remotamente. A gente
retira em qualquer lugar da capital de São Paulo

e leva para quem precisa. Seja altruísta:


abraagaveta.com.br

Marcelo Godoy


Em uma ação inédita contra
o Brasil, que barra qualquer
pretensão de se ampliar acor-
dos comerciais com os EUA,
24 deputados democratas da
Comissão de Orçamento e
Tributos (Ways and Means)
da Câmara dos Deputados
dos EUA informaram na quar-
ta-feira o escritório comer-
cial da Casa Branca que “têm
fortes objeções à busca de
qualquer acordo comercial
ou à expansão de parcerias co-
merciais com o Brasil do pre-
sidente Jair Bolsonaro”.
Ex-embaixador em Washing-
ton, Rubens Ricupero afirma
que a carta dos democratas da
Ways and Means “enterra” qual-
quer possibilidade de acordo en-
quanto a Câmara tiver maioria
da oposição ao republicano Do-
nald Trump. “Nunca vi um do-
cumento assim. Ela é a mais im-
portante comissão do Congres-
so americano. Essa carta signifi-
ca que nenhum acordo com o
Brasil será feito enquanto a Câ-
mara tiver maioria democrata.”
Para ele, a situação deve se
agravar ainda mais se o demo-
crata Joe Biden for eleito presi-
dente. “Ele é muito mais com-
prometido com a pauta ambien-
tal do que Barack Obama.” Bi-
den, com 53%, lidera as pesqui-
sas de intenção de voto para a


eleição deste ano com dez pon-
tos à frente de Trump (43%). A
votação americana, entretanto,
é definida por meio de um colé-
gio eleitoral, o que torna mais
decisivo o triunfo em Estados
em que a preferência por demo-
cratas ou republicanos se alter-
na. Trump se elegeu graças a vi-
tórias no Meio-Oeste, mesmo
tendo menos votos do que Hil-
lary Clinton no geral.
A carta foi endereçada ao re-
presentante comercial da Casa
Branca, o embaixador Robert
Lighthizer. Nela, o presidente
da comissão, o deputado Ri-
chard Neal, e seus colegas de
partido contam que decidiram
escrever o documento depois
de Lighthizer afirmar, em maio,
após conversa com o chanceler
brasileiro, Ernesto Araújo, que
desejava intensificar a parceria
econômica com o Brasil, incluin-

do uma simplificação do comér-
cio e “boas práticas regulató-
rias”. Para tanto, consultaria o
Congresso. “Em resposta, nós
julgamos importante enumerar
a litania de razões pelas quais
consideramos inapropriado
que a administração abra discus-
sões sobre parcerias econômi-
cas de qualquer tipo com o líder
brasileiro que desrespeita o es-
tado de direito e ativamente des-
mantela árduas conquistas de
direitos civis, humanos, ambien-
tais e trabalhistas.”
A carta segue afirmando que,
por meio de retórica e de ações,
o governo demonstra “comple-
to desrespeito por direitos hu-
manos básicos, pela necessida-
de de se proteger a Floresta
Amazônica, os direitos e a digni-
dade dos trabalhadores e man-
tém práticas econômicas anti-
competitivas”. Essas condições
demonstrariam que o Brasil sob
Bolsonaro “não pode ser consi-
derado preparado para assumir
novos padrões de direitos traba-
lhistas e de proteção ambiental
previstos no acordo EUA-Méxi-
co-Canadá”.

Peso nas decisões. Os demo-
cratas têm larga maioria na co-
missão. Sua importância pode
ser medida pelo fato de o presi-
dente americano precisar de au-
torização dela para negociar
acordos comerciais que não se-

jam emendados pelo Congres-
so – fast tracks. Também por
ela passam não só cada tostão
gasto em políticas públicas bem
como decisões sobre impostos
e taxas e acordos comerciais in-
ternacionais. Para o embaixa-
dor Roberto Abdenur, “manifes-
tações como essa de agora terão
desde logo impacto, pois inibi-
rão o governo americano de le-
var adiante novos entendimen-
tos com o Brasil”. Ele concorda
com Ricupero e diz que as rela-
ções com os EUA “vão se compli-
car muito se Biden for eleito”.
“A excessiva ligação de Bolsona-
ro com Trump só fará exacerbar
os ânimos contra o Brasil.”
Ricupero, que foi embaixador
nos EUA no governo de George -
Bush (1989-1993) e conselheiro
político em Washington nos go-
vernos dos ex-presidentes Ge-
rald Ford (1974-1977) e Jimmy
Carter (1977-1981), aponta ain-
da na carta democrata a união
de dois tipos de argumentos, o

ambiental e o protecionista, ca-
da vez mais comum nos EUA e
na Europa. “A chance de o Brasil
obter alguma coisa na área agrí-
cola em uma acordo comercial
com os EUA é próximo de zero.
Só para citar um exemplo, não
há lobby mais forte no Congres-
so do que o do algodão, que tem
apoio em peso dos congressis-
tas do Texas.”
De fato, em um dos últimos
parágrafos do documento dos
democratas, os deputados di-
zem considerar existir pouca
perspectiva de oportunidades
de acordo para o agronegócio,
pois muitos dos “produtos ex-
portados pelo Brasil já são mui-
to competitivos no mercado
americano, mesmo sem as van-
tagens da eliminação de tarifas
de um acordo comercial”. E
conclui: “Além disso, produto-
res brasileiros têm um históri-
co de usar práticas desleais de
comércio”.
A carta conclui afirmando

que buscar um acordo com o
Brasil pode prejudicar a luta de
defensores dos direitos huma-
nos, trabalhistas e ambientais
brasileiros para promover o Es-
tado de Direito e comunidades
marginalizadas.
Trump busca aumentar os la-
ços com o governo Bolsonaro,
não só os comerciais como os
militares e sanitários. Na sema-
na passada, o americano afir-
mou que a Casa Branca forne-
cera 2 milhões de doses de hi-
droxicloroquina para comba-
ter o Sars-Cov-2 no Brasil. O
Estadão procurou o Itama-
raty e o Ministério da Econo-
mia, mas nenhum deles se ma-
nifestou.
A ação ocorre concomitante-
mente à aprovação de moção no
Parlamento da Holanda, rejei-
tando o acordo entre a União Eu-
ropeia e o Mercosul por razões
semelhantes às americanas.
“Nosso isolamento está cada
vez maior”, afirmou Ricupero.

lPreocupação

NICHOLAS KAMM/AFP

Defesa. Carta foi endereçada ao representante comercial Lighthizer, na foto com Trump,

Comitê da Câmara


dos EUA se opõe a


acordo com Brasil


“Ela (Ways and Means) é a
mais importante comissão
do Congresso americano.
Essa carta significa que
nenhum acordo com o
Brasil será feito enquanto a
Câmara tiver maioria
democrata.”
Rubens Ricupero
EX-EMBAIXADOR DO BRASIL
EM WASHINGTON

Maioria dos parlamentares democratas se diz contrária a qualquer


tipo de pacto comercial com o governo de Jair Bolsonaro

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