Estado de Minas (2020-06-19)

(Antfer) #1

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  1. ESTADO DE MINAS Sexta-feira,^19 dejunhode^2020


●Edição:Carlos Marcelo●Ediçãodearte:Júlio Moreira●Revisão:AdemarFulgêncio●Contato:[email protected]

Sobosignodainquietude


Tendoaobra de Gustav Jung


comoreferência, oengenheiro


eletricista GeorgeBorten estreia


na literaturaaos 73 anos com


umareuniãodecontosnascidos


emnoites de insônia,apartir de


experiênciasreaisao longoda


trajetória profissional


Oprimeirolivronasceuaos
73 anos,poucodepoisqueoen-
genheiroeletricistaGeorgeBor-
ten,naturaldoRiodeJaneiroera-
dicadoemBeloHorizonte,já
aposentado,passouasentir-se
atormentadopelavontadedees-
crever.Dominadoporumdesejo
profundoderegistraras suashis-
tórias,obcecadoemnoitesdein-
sôniaporpersonagensqueexi-
giamviràvida,assimfoigestado
OcanaldeDotonbori,lançado
pelaQuixote+DOEditorasAsso-
ciadas,já disponível aosleitores
nositedaeditora(www.quixote-
do.com.br)enaLivraria Quixote,
emBeloHorizonte.
São 22 contosqueseapro-
priamdevivênciasreaispara
fundi-lascomoimagináriofic-
cional.Nasceramdevivênciasao
longodeumavidaprofissional
quelheabriuasjanelasaomun-
do.Fosseauditandoacapacidade
técnicaindustrialdefornecedo-
resnossubúrbioscariocasouem
outroscantosdoBrasil; fossena
inspeçãodeequipamentosque
seriamcompradosemOsaka,
Kyoto–ambasnoJapão–ouTr-
bovlje–antigaIugoslávia,atual
Eslovênia–, ofatoéqueas perso-
nagensdeixarammarcas.Outras
históriasnasceramdeexperiên-
ciassurgidasdadimensãoestri-
tamente pessoaldeGeorgeBor-
tenoueminteraçãoeconversas
comamigosefamiliares:como
osrelatosdopai,tenente Borton,
aviadornaSegundaGuerraMun-
dial,quesobrevoavaoCanal da
ManchaquandoaAlemanhana-
zistaserendeu,ouocasodopis-
toleiroDionísio,executadopelo
delegadoemsuaúltimamissão,
naqualoacompanhavaaúltima
mulherqueamou.
Emquepeseofatodeoscon-
tosreuniremumamiscelâneade
situações–docotidiano,devia-
gensedeexperiênciasmarcan-
tesreveladaspordiferentespes-


soasdorelacionamento doautor
–ofio queamarraolivroéabus-
ca.“Seavidanosparecesemsen-
tido,serátalvezporque,como
propostopeloexistencialismo,
cabeanóscriá-lo,nodia adia da
nossaexistência.Essaprocura,
essaconstruçãoincessante,éo
quenosdistinguecomohuma-
nos.Porqueserhumanoédesco-
brir queéabuscaemsi queéo
nossopropósito.Nestecaminho
nãoháumdestino,mas simuma
permanente viagem.Nãohaverá
portodechegada”,consideraGe-
orgeBortenaoapresentaropró-
prio livro.
Essaéabuscaqueoautorfaz
tambémtomandoporreferência
olegadodeCarlGustavJung
(1875-1961),psiquiatraepsicote-
rapeutasuíçoquedesenvolveu
osconceitosdearquétipoein-
consciente coletivo,extrema-
menteinfluentesemdiversas
áreasdoconhecimento,comoa
psiquiatria,apsicologia,aciência
dareligião,asartesealiteratura.
NocontoJungeaarte,oautor as-
socia essaprocuradoexistiràex-
pressãodaarteeaopercursodo
artista, cuja obra se apresentaco-
momensagemdoinconsciente
coletivoparatodaahumanidade.
“A arteaquinãoésublimação,fu-
ga,mas,sim,encontro,descober-
ta.Nessecaminhoparadentro,a
primeiracamadaencontradaé
semelhante aoinconsciente pro-
postoporFreud,ouseja,umde-
pósitodesentimentosnegativos
recalcados.Équandose consegue
passarparaalémdessepontoe
continuaraviagemquese chega
aoreinodaarte,dosublime,da
espiritualidadeedatranscendên-
cia, daunidadecomocosmos”,
escreveoautor.
Já emAcasadolago,George
Bortenretomaatemáticaque
abreeencerraolivro.“Omaiorle-
gadodeJungéaconstataçãode
queapsiquehumanaevolui sem

cessar,mesmonavelhice.Écomo
seanossavidaestivessesendo
configuradaporummitopes-
soal,umalendaquedessesenti-
doatantosfragmentos.Nareali-
dade,essadescobertadalenda
pessoalseconfunde,emparte,
comatradicional buscadosenti-
dodavida,quesempreassustaas
pessoascomosendoumcami-
nhocomplicadoedifícil”,diz ele.
Bortenconsideraque,pormais
desafiadoredolorosoqueseja,é
impossível aoserhumanonegar-
seaoamadurecimentoemocio-
nal, permanecendocomoeterna
criança.Dizoautor:“A quifica
bastanteclaraadiferençaentre
procurarafelicidadeeentender
oseudestino,oseuchamado
pessoal.Nãoépossível evitaras
sombras,nemmesmodeixarde
veraluzqueasprovoca.Pode-

mosatéficarparados,masoca-
minhoànossafrente estarásem-
prenosaguardando”.

Depoisde umalongacarreiraco-
mo engenheiroeletricista,como
foiadecisãodesetornarum es-
critor?
Aminhaatividadeprofissio-
nalmelevou,duranteavida,a
muitasviagens. Essecontato
comoutrasculturas,comoou-
tro,odiferente,sempremefasci-
nou.Entãoháumapaixãopelas
descobertas.Eaconteceramcoi-
sassensacionais,muitosencon-
trosedesencontros.Háumanoe
meio,essashistóriascomeçaram
avoltaràminhacabeça.Ashistó-
rias,ospersonagensse formaram
comosemepedissemparaser
escritos,comose ospersonagens
estivessemdizendo:vamosmor-

reredesaparecer,alguémtemde
narrarparanãodeixarmosde
existirsimplesmente.Tudoisso
foirodandoaminhacabeçaeeu
senti anecessidadedeescrever.
Sãotodoscontosquepartemde
umpontoreal,defatos,porém,
sãoadaptadosliterariamente,
semmutilar-semutuamente.Ao
finalizarestelivro,livrei-mede
umprofundaangústia,deivida
àsvivênciasemesenti mais em
paz.Fuioquequeria ser.Escrevi
oquequeria,mesenti liberto.

Todos nós olhamosomundopor
meiode valores que nos empres-
tam um enquadramento,umre-
ferencialpolíticoeideológico.
Quaissãoosvalores ereferências
que fundamentam oseu olharpa-
ra omundo?
Souummísticoagnóstico–ou

seja,umapessoaquenãoestáli-
gadaaumareligião,mas temes-
piritualidade.Omeuolhar,ami-
nhaformadever omundo,éhu-
manista,pregaquese aceitecom
ternuraacondiçãohumanaeas
circunstânciasdecadaum.A
mensagemquequispassarfoi:
esteéomundo,vocêtemdelidar
comele.Procure compreenderas
motivaçõesdospersonagensco-
mosereshumanosquesão,sem
ojulgamentorápidonaprimeira
ação.Essaéamensagem.Politi-
camente,meconsideroumapes-
soade“centro”,ouseja,aquela
minoria hoje,noBrasil,devasta-
daeironizada,porqueéumapo-
siçãodifícil atéquandose fazcrí-
ticasàesquerdaeàdireitapara
nãoincorreremfalsassimetrias.
Agora,considerofundamental
serhonestocomigomesmo,ex-
poroquepenso,semenganara
mimeaosoutros.Nofundo,sou
umpoucoanarquista,umpouco
existencialistaeumpoucocon-
servador–nãonosentidoquese
dáàpalavrahoje–masàantiga,
aoestilodomeuavô.Eagente
tenta manter oequilíbrio.Nessa
idade,senãosouoquesou,não
sounada!

Entreos22contos, qualoque
consideramais representativo?
ODionísio,opistoleiro.Heróiou
vilão?Tudoérelativo.Todosos
valoresestãoalinumagangorra.
Achoqueconseguimostrarnes-
secontocomoascoisassãoflui-
das.Emtermosmetafísicoséa
discussãoentreobemeomal.O
velhopistoleiro,emsuaúltima
missão,executadopelopolicial
emfrentedaigreja,queexecu-
toutambémamoçaqueacom-
panhavaopistoleiro.Umcontex-
toquenoslevaaquestionaros
conceitos.

●●OCANAL DE DOTONBORI
●●De George Borten
●●Quixote+DOEditoras
Associadas
●●133 páginas
●●R$ 45

Borten, nascidono Rio de Janeiroeradicadoem BH,sobreaorigem das 22 históriasdo livro:
“Nãoépossívelevitaras sombras,nem mesmodeixar de veraluz que as provoca”

BERTHAMAAKAROUN


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