National Geographic - Portugal - Edição 232 (2020-07)

(Antfer) #1
102 NATIONAL GEOGRAPHIC

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O primeiro desafio é manter uma bilbioteca de
culturas de esporófitos saudáveis com uma diver-
sidade de genótipos que permita aumentar a taxa
de sucesso da aquicultura de Asparagopsis taxifor-
mis. É nesta área que a equipa liderada por Leo-
nardo Mata tem feito os avanços mais inovadores.
Ao abrigo do projeto Greener Grazing, Mata
chefia a missão científica de uma equipa multi-
disciplinar espalhada pelo mundo. Os laborató-
rios do Centro de Ciências do Mar (CCMAR) da
Universidade do Algarve são a grande incubadora
de várias estirpes de Asparagopsis taxiformis de
Portugal e de outros lugares do mundo, cultivadas
em ambiente laboratorial controlado. Simulta-
neamente, nos laboratórios da empresa Australis
em Khánh Hòa, no Vietname, cultivos com várias
estirpes locais são mantidos com intuito de opti-
mizar as taxas de crescimento da alga e conseguir
uma produção significativa de esporos que serão
depois depositados no sistema de cordas que, por
sua vez, será montado no mar e onde a alga se de-
senvolverá até ser colhida, processada e embalada
para poder finalmente cumprir o seu propósito:
integrar a ração diária do gado bovino, reduzindo
a emissão de metano destes ruminantes.
Este projecto que disponibilizará finalmente
Asparagopsis taxiformis para abastecimento das
grandes produções de gado em todo o mundo
pode agora estar perto da concretização. Sediado
no Vietname desde o início de 2020, Leonardo
Mata trabalha com a equipa local nos laboratórios
de Khánh Hòa para desenvolver a maternidade
e demonstrar que todos os passos são possíveis
a uma escala semicomercial, passível de ser au-
mentada. Leonardo Mata respira de satisfação e
conta que agora é tudo uma questão de tempo
As cordas onde se desenvolveram os esporos
pelos quais Mata tanto lutou em laboratório es-
tão finalmente em mar aberto e sob constante
observação. Aquele que é provavelmente o pri-
meiro sistema de aquicultura em mar aberto de
Asparagopsis taxiformis tem o cunho da inves-
tigação científica portuguesa e poderá trazer ao
planeta mais alento nos próximos meses.
No pressuposto de sucesso da produção de As-
paragopsis taxiformis em larga escala, manter-
-se-ão algumas dúvidas: conseguirá a indústria
produzir e distribuir eficazmente a alga para que
ela obtenha os efeitos esperados no combate à
emissão de gases com efeito de estufa para a at-
mosfera? Será a redução da emissão de metano
razão suficiente para motivar as grandes empre-
sas de produção de gado a incluir o novo produto


na ração dos seus animais, adicionando um custo
à sua produção? Ou poderá a inclusão desse pro-
duto ser imposta pelas entidades governamentais
como medida de combate ao aquecimento global?
Uma vez mais, a experiência, paixão e empe-
nho de Robert Kinley poderão ser o óleo para o
bom funcionamento desta máquina acabada de
nascer. Os resultados publicados em Fevereiro
deste ano, num artigo científico liderado por
Kinley, vieram confirmar a eficácia da proprie-
dade antimetanogénica (redução de até 98%) da
Asparagopsis taxiformis com taxas de inclusão
de alga dez vezes menores do que no estudo an-
terior (0,20% na mistura total da ração).
Igualmente surpreendente é o ganho médio
diário de peso dos bois de 40% nos últimos 60
dias da experiência com uma adição de apenas
0,10% de alga na ração. Durante o processo de
digestão destes ruminantes, a produção de me-
tano resulta como subproduto da fermentação
anaeróbica da matéria orgânica ingerida.
O estudo de Kinley não só mostra que a alga
actua como agente de inibição da produção de
metano (CH 4 ), evitando a ligação das moléculas
de carbono (C) às de hidrogénio (H), como prova
ainda que essas moléculas uma vez disponíveis
contribuem amplamente para eficiência energé-
tica destes animais, trazendo-lhes benefícios à
saúde e crescimento. Kinley foi ainda mais lon-
ge e recolheu amostras das carcaças dos animais
alimentados com o novo aditivo orgânico, pro-
vando que o sabor, textura e suculência da carne
dos animais são totalmente preservados.
Se as razões ambientais não forem suficientes
para persuadir os produtores de gado, os resulta-
dos obtidos por Robert Kinley neste recente en-
saio mostram que a introdução de percentagens
muito baixas do novo aditivo orgânico na ração
do animal pode tornar as explorações de gado
mais lucrativas, assegurando a qualidade do seu
produto. Esta poderá ser a catapulta para a in-
trodução da alga no mercado e o início de uma
era mais sustentável em toda a indústria pecuá-
ria. No futuro, talvez o metano produzido pelo
gado seja só uma reminescência do passado. j
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