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Thinley vestia um casaco gasto, um boné de
basebol e exibia a calma de um homem que já
resistiu a 42 invernos nos Himalaia. Estava a
contar-me uma história que, a avaliar pela sua
expressão, ainda o surpreendia: a maneira como
as pessoas de Kibber tinham deixado de odiar os
leopardos-das-neves, passando a venerá-los.
“Tudo começou com Charu”, disse ele.
Em 1996, Charu Mishra, então um estudante de
Deli com 25 anos, chegou a Kibber. Nesta pequena
aldeia, vivem dezenas de famílias em casas de bar-
ro e madeira. A aldeia acolhe um templo budista e
os monges assinalam o meio-dia com cânticos que
ecoam pelo vale. Os habitantes de Kibber criam
gado há gerações e, tal como todos os pastores dos
Himalaia, encaram os leopardos-das-neves como
ameaças graves à sua subsistência.
O plano de Charu era estudar o impacte dos
animais domésticos sobre a vida selvagem do vale
de Spiti. Arrendou um quarto e, ao longo de dois
anos, passou os dias a examinar as pastagens de
altitude. Também mergulhou na vida da aldeia.
O liceu não tinha um professor de matemática e,
por isso, ele ensinava a disciplina à noite. Quan-
do as pessoas adoeciam, ele conduzia-as a uma
clínica. Prestava serviços domésticos, encontrava
animais perdidos e jogava críquete.
Charu vivia há algum tempo em Kibber quan-
do pediu aos anciãos da aldeia para pensarem
em reservar algumas pastagens da montanha
para os animais selvagens. Eles concordaram e,
sem a concorrência do gado, o número de barais
quadruplicou. De seguida, sugeriu-lhes algumas
tácticas não letais para lidar com os leopardos que
Uma armadilha
fotográfica capta o
velho macho numa
montanha com vista
para o vale de Spiti.
O fotógrafo Prasenjeet
Yadav observou este
felino durante dois
anos antes da morte
do animal, em Março,
quando caiu de um
penhasco ao perseguir
uma cabra da Sibéria.
PRASENJEET YADAV