National Geographic - Portugal - Edição 230 (2020-05)

(Antfer) #1
PARAONDEFORAMTODOSOSINSECTOS? 25

Ficam sem alimento, sem estímulos ambientais e
tudo começa a desmoronar-se.”


O QUE SE PODE FAZER para inverter estas tendên-
cias sinistras? Tudo depende das causas. Se forem,
sobretudo, as alterações climáticas, só uma acção
global de redução das emissões pode fazer a dife-
rença. Se os pesticidas ou a perda de habitat forem
os principais culpados, então as acções regionais ou
locais podem ter grande impacte.
Num esforço para proteger os polinizadores,
a União Europeia baniu a maioria dos pesticidas
neonicotinóides, que vários estudos associaram a
declínios de aves e insectos. No Outono passado, o
governo alemão adoptou um “programa de acção
para a protecção dos insectos”, que pedia o res-
tauro de habitats, o fim do uso de insecticidas em
determinadas áreas e da produção de glifosato. É
possível que este herbicida esteja a eliminar plan-
tas essenciais para a subsistência dos insectos e as
investigações sugerem que também poderá afec-
tar o respectivo sistema imunitário. “Não podemos
viver sem insectos”, sublinhava o plano de acção.


Recentemente, um grupo de cinco dezenas de
cientistas apresentou como proposta um “mapa
das estradas” para a conservação dos insectos,
com as seguintes recomendações: “Dar passos
agressivos no sentido de reduzir as emissões de
gases com efeito de estufa”, preservar mais áreas
naturais como refúgio para os insectos e impor
um controlo mais estrito das espécies exóticas.
“Há muitas acções possíveis, independente-
mente do resultado final, que serão boas práticas”,
disse David Wagner. “Tudo o que se relacionar
com o clima estará no topo da minha lista. Se se re-
duzir o uso de pesticidas para fins estéticos, como
nos relvados, será uma vitória para o planeta.”
Uma das poucas organizações do mundo que
se dedicam expressamente à conservação de in-
vertebrados é a Sociedade Xerces, sediada em
Portland. Esta sociedade foi baptizada em home-
nagem à Glaucopsyche xerces, uma borboleta en-
démica da península de São Francisco que se ex-
tinguiu na década de 1940 devido à urbanização.
Certo dia, acompanhei o director da Xerces,
Scott Black, em visitas a alguns dos seus projectos
cooperativos no vale central da Califórnia. Enquan-
to conduzia o automóvel, Scott lembrou-se de um
dos seus primeiros amores, um Mustang comprado
quando era adolescente, em 1979. Era preciso lavá-
-lo constantemente, pois ficava cheio de insectos
mortos no pára-brisas. Agora, Scott raramente pre-
cisa de raspar insectos do seu carro. Este fenómeno
tem sido tão amplamente notado que se tornou co-
nhecido como o “efeito pára-brisas”.
Quilómetro após quilómetro, fomos passando
por campos plantados. O meu interlocutor abana-
va a cabeça. As explorações agrícolas do vale costu-
mavam estar rodeadas por secções com erva onde
os insectos se refugiavam. Agora, tendem a ser ara-
das uniformemente. “Só vejo ausência de habitat.”
Acabámos por chegar a Bixler Ranch. Nesta
herdade de 520 hectares, cultivam-se amêndoas e
mirtilos e os seus proprietários decidiram traba-
lhar com a Xerces para plantar sebes vivas e devol-
ver à paisagem alguns habitats perdidos ao longo
de mais de meio século de agricultura intensiva.
Uma sebe foi plantada. Arbustos mais altos como
roseiras silvestres e sabugueiros alternavam com
outros mais pequenos. O dia estava quente e mui-
tas plantas pareciam sequiosas. Mesmo assim,
várias abelhas zumbiam nas imediações. “Se to-
marmos estas acções, elas vêm”, disse Scott.
“As plantas e os insectos formam o tecido deste
planeta”, prosseguiu. “Estamos a rasgá-lo em pe-
daços e precisamos de cosê-lo novamente.” j
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