A produção de regimes de valor / 163
o capital dessa amarra localizacional. Antes d a invenção d a energia nuclear, o
urânio era u m recurso completamente irrelevante. O s metais de terras raras eram
irrelevantes até que novas tecnologias os transformaram em recursos essenciais. As
habilidades de trabalho cuidadosamente aperfeiçoadas nas regiões industrializadas
antes dos anos 1970 tornaram-se redundantes depois das m udanças tecnológicas
que incorporaram essas habilidades à tecnologia das máquinas e d a automação.
Aptidões culturais são im portantes para a evolução de certos tipos de consumis-
mo que sustentam a busca intensa por sím bolos de distinção, classe e bom gosto
em certos mercados do m undo. A produção de vontades, necessidades e desejos,
conforme assinalamos anteriormente, constitui um aspecto crucial d a história do
capital, sem o qual ele já teria desaparecido. A natureza e a natureza humana, que
oferecem toda sorte de dádivas gratuitas à acumulação de capital, não são dadas
“pela natureza” nem são fruto de um a “natureza humana” imutável. Tam pouco
são distribuídas uniformemente pelo mundo. Elas são produzidas e eternamente
mutáveis, e o próprio capital tem um papel m uito importante em sua produção.
O resultado não é uma homogeneidade global, e sim um a diversificação regional.
O valor da força de trabalho, por exemplo, difere “de acordo com o clim a e o nível
do desenvolvimento social; depende não só das necessidades físicas mas também
das necessidades sociais historicamente desenvolvidas,, que se convertem num a
segunda natureza” 19.
Investimentos de capital fixo na terra que foram amortizados há m uito tempo
tornam-se parte dessa “segunda natureza” , e a evolução cultural também não tem
ficado imune às influências da acumulação de capital. O espírito de empreende-
dorismo é criado, não dado, e é distribuído de maneira desigual, assim como os
investimentos que produzem um a segunda natureza. Reconhecer a importância
disso na formação de regimes de valor distintos não significa um apelo a um tipo
de determinismo físico òu cultural, e sim abrir, mas não encerrar, um a discussão
sobre a integração dialética da acumulação do capital e da perpétua evolução daâ
condições geográficas contextuáis d a natureza e d a natureza hum ana no interior
das quais esse processo ocorre.
N em todas as dádivas são benignas - secas, enchentes, furacões, terremotos e
erupções vulcânicas, assim com o revoluções, guerras religiosas e culturais, rivali
dades nacionalistas e movimentos anti-imigração, são as mais flagrantes dentre
as diversas consequências infelizes ou indesejadas que configuram as complexas
relações entre a acumulação de capital e a evolução d a natureza e d a natureza hu
mana. N ão podem os ignorar o poder que, de maneira mais insidiosa, os investi
mentos passados possuem no sentido de im por inércia geográfica; O capital pode
19 Karl Marx, O capital Livro III, cit., p. 921.