A loucura da razão econônica- David Harvey

(mariadeathaydes) #1
94 / A loucura da razão econômica

Portanto, poupança e eficiência crescente nos custos necessários da circulação
são cruciais, defendia Marx, para que o trabalho improdutivo não se torne um locus
ainda maior - embora involuntário - de antivalor. Um resultado previsível é que
as condições de exploração do trabalho vivo nessas atividades improdutivas podem
ser tão cruéis quanto na produção (e em alguns casos até mais).
E difícil definir o limite entre o trabalho improdutivo socialmente necessá­
rio e o excessivo. Boa parte do debate político sobre o ambiente regulatório gira
em torno justamente da busca de normas adequadas. Nesse ponto, a discussão de
Marx sobre a regulação da duração da jornada de trabalho fornece um modelo
interessante. A concorrência intercapitalista feroz pelo mais-valor absoluto leva a
jornadas e imensidades de trabalho tão grandes que põe em risco a vida, a saúde e
a capacidade de trabalhar dos trabalhadores. Portanto, é necessário, até mesmo do
ponto de vista do capital, instituir formas coletivas de regulação para estabelecer
um limite, por assim dizer, à concorrência para proteger o capital dos efeitos des­
trutivos, sobre a força de trabalho, de uma concorrência ruinosa. Mas, se o poder
organizado do trabalho, aliado a outros interesses, se tornar cada vez mais forte e
conseguir restringir dramaticamente a extensão da jornada de trabalho, isso passará
a constituir uma ameaça anticapitalista no sentido oposto. A adjudicação entre os
direitos do trabalho e os direitos do capital no que diz respeito às horas de trabalho
depende do equilíbrio das forças de classe: “Entre direitos iguais, quem decide é a
força”32. Da mesma maneira, o equilíbrio entre o trabalho produtivo e o trabalho
improdutivo, em qualquer formação social capitalista, é definido em função do
desenrolar dos processos e lutas sociais e políticas.


A POLÍTICA DIRETA DO ANTIVALOR


Atividades e políticas anticapitalistas, baseadas na elaboração de maneiras alter­
nativas de viver fora da produção e troca de mercadorias, são generalizadas, em­
bora com frequência de pequena escala. Se, como insiste Bertell Ollman, valor é
trabalho alienado, segue-se que a busca política de uma existência não alienada
implica a negação ativa e consciente da lei capitalista do valor em nossa vida indi­
vidual e coletiva. A política do antivalor tem várias formas. Economias solidárias
e comunidades intencionais, por exemplo, podem tentar garantir sua reprodução
para além do alcance da produção de valor33. Suas relações de troca, tanto internas
quanto externas, não serão necessariamente baseadas em mecanismos de mercado.


32 Idem, O capital, Livro I, cit., p. 309.
33 Peter Hudis, Marxs Concept ofthe Alternative to Capitalism, cit.

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