Crusoé - Edição 123 02020-09-05)

(Antfer) #1
04/09/ 20 REPORTAGEM

Varejão no escuro


Primeiro, como mostrou Crusoé,
o governo federal usou recursos do
combate à Covid para afagar
deputados e senadores. Agora, os
gestores que receberam a verba
querem mantê-la fora do radar da
fiscalização


André Spigariol

Há três semanas, Crusoé revelou
que o governo usou uma verba
bilionária destinada a combater o
coronavírus – um total de 13,
bilhões de reais – como moeda de
troca em negociações políticas com
parlamentares. Com o toma lá dá cá
chancelado pelo Ministério da
Saúde, pela Secretaria de Governo
da Presidência e pela liderança do
governo no Congresso, parte do


dinheiro que deveria parar nos cofres
das cidades mais afetadas pela
pandemia acabou direcionada a
redutos eleitorais de deputados e
senadores, não importando o grau
de disseminação da doença nesses
locais. Houve casos em que a verba
foi parar em municípios que nem
sequer haviam sido atingidos pela
epidemia de coronavírus.

Procurados para falar sobre a
efetiva aplicação dos recursos no
combate à Covid-19, que já matou
de 120 mil pessoas no país, os
prefeitos contemplados se
prontificaram a defender a
transparência na utilização do
dinheiro público. Não foi bem o que
aconteceu. Em 1º de julho, dia da
liberação do dinheiro pelo governo
federal, o ministro da Saúde,

Eduardo Pazuello, recebeu um ofício
assinado pelo presidentes dos
Conselhos de Secretários de Saúde,
em que eles – pasme – simplesmente
se recusavam a prestar contas
desses recursos.

Semanas antes, técnicos do
Ministério da Saúde haviam inserido
no Sistema de Informações sobre
Orçamento Público em Saúde, o
Siops, uma funcionalidade criada
para que os secretários de Saúde dos
municípios declarem como a verba
dedicada ao coronavírus vem sendo
gasta. Apesar de ser opcional, várias
cidades começaram a inserir
informações no banco de dados, que
é usado por órgãos de controle –
como o TCU – para fiscalizar o
orçamento federal.

A atitude constrangeu os gestores
interessados em omitir as
informações e eles iniciaram, então,
uma ofensiva para inviabilizar o
sistema. “Tira o painel!”, bradou um
dos representantes municipais em
reuniões reservadas com o Ministério
da Saúde. “A pessoa que assume um
cargo de gestão pública deveria ter
dois CPFs”, lamentou outro, fazendo
alusão aos processos em curso nos
órgãos de controle contra gestores
suspeitos de mau uso de recursos
públicos. A pressão deu resultado e
a Saúde acabou “congelando” o
painel de gastos dos prefeitos
relacionados à Covid-19 – a tela
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