Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1
ção. Mas os Balang tinham atacado os Bala como um morung diferente
do seu, e não como seus irmãos de clã no interior deste mesmo morung.
Nesta última qualidade os Bala tinham direito à sua proteção e sabiam
tão bem disso que se refugiaram somente nos morung com os quais
lhes era proibido contrair casamento, e nunca junto de seus aliados. O
morung Bala desapareceu, mas quase a metade de seus membros fo-
ram aceitos entre os Balang e tratados como tais. Somente quinze anos
mais tarde o morung Bala foi reconstruido e reaberto."
Ninguém duvida que na maioria dos casos não se possa explicar o
aspecto atual de uma estrutura social por acontecimentos do mesmo ti-
po. Mas seria preciso ser singularmente miope para não ver nada mais
além disso. Apesar dos incidentes, conflitos e destruições, as estruturas
consideradas permaneceram estruturas de reciprocidade. Sua verdadeira
natureza está ligada aos fatores que as fazem subsistir como tais e não
à história anedótica que lhes impõe um continuo esforço de readaptação.

O exemplo dos Yokut e dos Mono ocidentais da Califórnia não é
menos notável, pois estamos aqui em presença de um grupo em que
somente certos elementos possuem a organização dualista, e estes mes-
mos não a conhecem todos no mesmo grau. Sobretudo, onde ela existe
superpõe-se a uma forma mais geral de organização, que determina com
precisão e desenvolve, sem contradizê-la ou substitui-la. Esta forma ge-
ral de organização consiste, por um lado, em um sistema de linhagens
patrilineares, hoje em dia reconhecido como base da vida social das
tribos californianas, e de outro lado, consiste em um apelo continuo às
obrigações reCiprocas entre pessoas, familias, linhagens, aldeias ou tribos.
l'Em cada ocasião de alegria ou de luto... encontrava-se sempre um
grupo de parceiros que prestavam serviço e traziam presentes, compen-
sados por serviços em sentido oposto de valor equivalente, em forma de
pérolas, cestos, ornamentos de plumas, peles ou alimento"." Temos, por-
-tanto, no inicio e em forma frusta, de um lado grupos (ou mais exa-
tamente parceiros, porque as relações de reciprocidade existem entre dois'
grupos, entre duas pessoas ou mesmo entre uma pessoa e um grupo,
como no caso dos rituais propiciatórios dirigidos aos totens a que se
referem os animais mortos na caça), e de outro lado uma rede de re-
lações bilaterais entre esses parceiros. Ao mesmo tempo, o casamento
é proibido entre todos os ta'a'ti ou parentes, compreendendo este ter-
mo todos os primos até o segundo e às vezes mesmo o terceiro grau.
Ora, que acontece nas tribos Mono e Yokut que superpõem a esta
organização geral uma divisão em metades? Nada é modificado, nada
é suprimido, mas as metades acrescentam alguma coisa, e isto segundo
três relações diferentes. Primeiramente, um tipo suplementar de oposi-
ções correlativas, funcionando de maneira análoga às precedentes. Em
seguida, um principio de sistematização, que permite agrupar e simpli-
ficar redes de relações anteriores. Finalmente, o meio de tratar segun-
do os mesmos métodos relações (tais como o casamento) que até então
não tinham sido conscientemente igualadas à reciprocidade.


  1. Ibid., p. 366-367.

  2. A. H. Gayton, Yokut and
    pOlogist, voI. 47, 1945, p. 416.


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