sujeito e o objeto. O que dá ao objeto seu valor é a "relação com o
outro". Somente o alimento tem valor Intrínseco para o faminto, mas
poucos objetos oferecem um Interesse constante em todo tempo e em
todas as circunstãnclas. O que é furiosamente desejado só é tal porque
alguém o possui: Um objeto Indiferente torna·se essencial como conse-
qüência do interesse que alguém nele tenha. O desejo de possuir por-
tanto é, antes de tudo, uma resposta social. E esta resposta deve ser
compreendida em termos de poder, ou melhor, de impotência. Quero
possuir porque se não possuir não poderei talvez obter o objeto, caso
venha algum dia a ter necessidade dele. O "outro" o conservará para
sempre. Não há pais contradição entre propriedade e comunidade, entre
monopólio e partilha, entre arbitrário e arbitragem. Todos estes vocábu-
los designam modalidades diversas de uma tendência ou de uma única
necessidade primitiva, a necessidade de segurança.
pode-se portanto dizer que a capacidade de repartir, de "esperar sua
vez", é função de um sentimento progressivo de reciprocidade, que por
si mesmo resulta de uma experiência vivida do fato coletivo e de um
mecanismo mais profundo de identificação com o outro.'
Ora, uma das bases mais comuns e mais Ingênuas da amizade entre
crianças é a gratidão pelas presentes recebidos. Mas as crianças "não
sentem tanto amor pelo tato dos presentes. Para elas o presente é amor.
Seu amor é mais função do fato de dar do que do próprio donativo.
Para elas, o ato de dar e a coisa dada são, simultãnea e propriamen-
te, amor".'\
Dar e receber presentes é pais "o sinal mais claro, o menos equi-
voco, do amor. Cada criança mostra de cem maneiras que o sentido mais
profundo da expressão "ser amado" eqUivale para ela a receber um pre-
sente, como também "ser odiada" quer dizer sobretudo ser excluída ou
desprezada ... " Além do valor íntrlnseco da coisa dada há o próprio
dom, como sinal de amor; e, ainda além, o dom como sinal do fato de
ser digno de amor: "a criança que se vê privada sente que tal lhe acon-
tece porque é má, porque é, ou foi, hostil ao doador. É esta experiência
que confere tão grande violência à gratidão da criança pelos presentes
recebidos e tanta amargura ao sentimento de perda que experimenta quan·
do foi esquecida. O presente não é somente sinal que o doador ama e
não odeia. É também um sinal que a criança que recebe é considerada
cheia de amor, sem inimizade e sem ódio"."
Assim se explica o desejo da criança de dar presentes enormes, mag-
níficos, "um urso branco verdadeiro". "uma grande locomotiva". É, ano
tes de tudo, desejo de poderio: "Se temos grandes locomotivas para dar
é na verdade porque somos protegidos e temos méritos. Não somos mais
a criança choramingas e impotente, inteiramente à mercê dos presentes
dos outros e impelida por inúteis angústias à raiva e à inveja... É uma
bênção maior dar do que receber, porque ser capaz de dar significa não
estar passando necessidade".
Estes sentimentos não se limitam aos objetos, mas são encontrados
também a propósito dos serviços. "Como as crianças apreciam calorosa-
mente os serviços que lhes prestamos!... Tommy... grita às crianças
- Ibid .• p. 276.
- Ibid., p. 272.
- Ibid., p. 273.
125