pre possível exprimi-la em termos de "relações". Os dois métodos, sem-
pre e em toda a parte, acham-se ao dispor do espírito humano, mas, por
uma singular razão, alguns sociólogos deixaram-se fascinar pelo que gos-
taríamos de chamar aristotelismo australiano. Estão convencidos de que
a lógica das classes representa, no domínio da família e do parentesco,
um método de pensamento mais simples e mais primitivo do que a lógica
das relações. Isto equivale a mostrar-se singularmente ignorante das cria-
ções da psicologia contemporânea e dar prova de pouco respeito pelos
documentos recolhidos no terreno. Na realidade, um sistema de classes
nunca pode ser postulado. Se existe, deve ser diretamente visível. Se
existiu, só pode ser inferido partindo de vestígios rigorosamente inexpli-
cáveis nos termos da situação atual. Alguns desses vestígios podem apa-
recer em forma de fenômenos de periodicidade. Neste sentido - mas
unicamente nesse sentido - o empreendimento de Held e de Granet pa-
rece legítimo, talvez mesmo coroado de sucesso. Uma outra indicação útil
provém da extensão da nomenclatura de parentesco, que deve ser função
da complexidade do sistema. Se sabemos existirem classes entre os Murn·
jin, não é somente porque os indígenas declararam isso, mas porque a
extensão da nomenclatura a setenta e um termos confirma exatamente
o grau de complexidade do sistema, tal como poderia ser deduzido par-
tindo da nomenclatura com quarenta e um termos dos sistemas Aranda
ou da nomenclatura com vinte e um termos dos sistemas Kariera. Ora,
o sistema chinês proto-arcaico deve ter possuído uma nomenclatura muito
restrita, '" e; as indicações, infelizmente fragmentárias, que possuímos so·
bre as nomenclaturas indianas sugerem uma condição análoga." Um novo
argumento ~. fornecido pela distinção terminológica entre o irmão da
mãe e o marIdo da irmã do pai. 3" As nomenclaturas reduzidas convêm
perfeitamente aos sistemas simples de troca generalizada, 31 mas reti-
ram toda probabilidade às hipóteses favoráveis à existência de sistemas
complexos.
Uma das razões que levaram a formular estas hipóteses reside na
multiplicidade dos grupamentos atual, ou antigamente, exogâmicos na ln-
dia. Já examinamos dois desses grupamentos, a casta, e o grupo sapinda.
É preciso acrescentar o gotra.
O gotra, em princípio, é um grupamento patrilinear, e é sempre exo-
gâmico. Por esse motivo, parece ser uma repetição desnecessária da casta,
que funciona ainda como unidade exógama na época de Manu e parece
ter-se conservado exogâmica ainda hoje no norte da lndia. Foi em grande
parte porque estava embaraçado com esta dualidade que Held julgou
encontrar uma solução elegante tratando o gotra como um antigo clã
matrilinear, que se tornou patrilinear com o correr do tempo, mas que,
na forma original, teria podido coexistir com a casta patrilinear, para
constituir uma organização bilateral." Held vê a confirmação do fato
- Cf. capo XXIU.
- Rivers, The Marriage 01 Cousins in India, loe. cit. A. M. Hocart, The Indo·
European Kinship System. Ceylon JOUTnal 01 Science, Secção G. voI. I, parte 4,
- Held, p. 77.
- Cf. capo XVI.
- Held, p. 73-74, 82, 85.
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