Claude Lévi-Strauss - As estruturas elementares do parentesco (1982, Editora Vozes) - libgen.lc

(Flamarion) #1
filha do irmão da mãe, o que torna inexplicável a intervenção do marido
da irmã do pai (diferente do irmão da mãe, por hipótese), a menos que
se apele - como Rivers é obrigado a fazer, porém sem qualquer prova


  • para um estágio mais antigo, hoje desaparecido, de casamento bilate-
    ral. ,.; Como raciocinaríamos no caso dos Katchin? Lembramo-nos que pos-
    suem um sistema simples de troca generalizada. Ora, na cerimônia do
    casamento vemos que intervêm simultaneamente o irmão da mãe da
    noiva e a irmã do pai do noivo, os quais de acordo com o sistema estão
    no entanto absolutamente excluídos de pOderem ser cônjuges. Além disso,
    o irmão da mãe do noivo (que é, ao mesmo tempo, o pai da noiva) não
    desempenha nenhum papel no casamento e, na verdade, nem pOde mesmo
    estar presente. O caráter simétrico da estrutura que une entre si os noivos,
    a irmã do pai de um, e o irmão da mãe de outro, na ausência de qual-
    quer possibilidade de acumulação de funções, é manifestamente a chave
    da situação (Figura 82).


Figura 82

Acrescentemos que vemos participarem, conforme os casos, a irmã
do pai oU'do marido desta. A interpretação de Rivers, a rigor, explicaria
o segundo: Caso, mas é ineficiente no que diz respeito ao primeiro. Ao
contrário, pode compreender-se que a irmã do pai sendo sempre o per-
sonagem essencial, seu marido a represente e att!e em lugar dela, em
sociedades nas quais a preponderância masculina é fortemente assegurada.

Contentar-nos-emos em lembrar rapidamente algumas outras objeções
que se impõem. Rivers continua a interpretar como vestígios de filiação ma-
trilinear (ou como fatos idênticos aos que se poderia esperar deste modo
de filiação) fenômenos que Radcliffe-Brown mostrou desde então (fun-
dando-se, ao menos em parte, sobre os mesmos dados, porque ao lado
da !ndia Rivers invoca Fidji) deverem ser postos em correlação com um
regime de filiação patrilinear.·~ Parece, também, considerar como adqui~
rido que a relação de assistência recíproca seja a atitude característica
entre o genro e o sogro. Sabemos que não é de modo algum isso o que
acontece, e por dois motivos. Entre os Naga, que praticam entretanto o
casamento dos primos cruzados, o tio matemo, sogro potencial, é atin-
gido por uma temível proibição. Inversamente, os muitos grupos africa-
nos, melanésios e americanos, que possuem ou não O casamento dos pri-
mos, há oposição, e não paralelismo, entre a respectiva atitude do sobrinho
e do tio, de um lado, e do sogro e do genro, do outro. Em um caso,
encontra-se solidariedade e afeição, no outro reserva e coação. Se os fatos


  1. Ibid., p. 615.

  2. A. R. Radcliffe Brown, The Mother's Brother in South Africa, The South Alrican
    Journal oI Science, vaI. 21, 1924.


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