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mencionados por Rivers fossem vestígios de um antigo sistema de casa-
mento entre primos cruzados bilaterais, haveria singular contradição entre
o papel desempenhado pelo tio materno da noiva (seu sogro potencial)
no momento do casamento e a atitude da mulher indiana com relação a
seu sogro. Esta exprime·se pela raiz vij, cujo sentido geral é "tremor", e
se aplica também à reação dos homens ao rugido do leão, ou dos pássaros
à vista do falcão, ou aos sentimentos do monge que esqueceu Buda. 21
Há, porém, uma dificuldade infinitamente mais grave, porque are·
lação especial, de ternura ou de temor, existente em inúmeras culturas,
entre o sobrinho e o tio materno, fascinou a tal ponto os sociólogos que
com demasiada freqüência lançaram-se sobre ela como o touro sobre a
capa do matador, sem se preocuparem com a rlatureza exata da realidade
recoberta por aquela relação. Suspeita·se que Rivers foi vitima dessa
imprudência. Não trataremos aqui da questão do tio materno em con-
junto. Esboçamos a solução desse assunto em outro trabalho." Lembra-
mos somente que Lowie estabeleceu que a relação avuncular encontra-se
tanto no regime patrilinear quanto no regime matrilinear. Radcliffe-Brown
dissociou-a em duas formas diferentes. Nós próprios sugerimos que estas
duas formas deviam, por sua vez, ser divididas em quatro modalidades.
É preciso, além disso, considerar um caso especial, do qual a lndia e
a América do Sul apresentam exemplos característicos, a saber, aquele em
que o casamento dos primos cruzados associa-se ao privilégiO matrimonial
do irmão da: mãe sobre a filha da irmã, porque o tio materno é então um
sogro atual ou potencial, quer se case com a filha do indivíduo, quer o
tio materno ,da mulher do indivíduo seja, ao mesmo tempo, o marido da
irmã desta' ültima.
Já citamos exemplos indianos de grupos que praticam esta forma de
casamento, e mesmo a preferem, em certos casos, ao casamento dos primos
cruzados. Encontra ilustração em numerosos costumes. Assim, entre os
Korava "um homem pode esposar a filha de sua irmã, e quando dá sua
irmã em casamento, espera dela que produza uma esposa para ele próprio.
Em conseqüência, o marido de sua irmã paga somente 7-8-0 Rs. das 60
do preço normal da noiva, no momento do casamento, e 2-8-0 Rs. suple-
mentares, cada ano, até que a mulher tenha uma filha". 20 A terminologia
do parentesco acentua o caráter de cunhado, atual ou potencial, que ocupam
entre os Korava (que também praticam a troca das filhas) os dois tios
matemos. li Ao se concluir o noivado, a família do noivo toma informações
para saber se a noiva tem um tio materno, ao qual deve ser pago o
preço. .. Mas, de fato, a quantia integral nunca é entregue. As vezes, al-
" guns pagamentos são efetuados, porém mais geralmente este dinheiro dá
motivo a inúmeras brigas. Contudo, se as duas famílias encontram-se em
bons termos, e se o marido goza da hospitalidade do tio materno de sua
mulher, ou o contrário, é comum que um diga ao outro depois de beber:
Escuta, cunhado, eu te paguei dois madras hoje, por isso retira-os do vóli
(preço da compra)". '" O termo cunhado, usado aqui pelo marido para
- Ao K. ...coomaraswamy, Samvega "A Esthetic Shock". Harvard Journal of Asiatic
Studies, vaI. 7, 1943, p. 174. - L' Analyse structuTale en linguistique et en anthTopologie, op. cito
- Thurstan, op. cit., vaI. 3, p. 486-487.
- lbid., p. 478.
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