Revista de Vinhos - Edição 371 (2020-10)

(Antfer) #1
Por sua vez, Tiago Alves de Sousa, da Quinta da Gaivosa, sublinha que
“2020 será porventura o ano mais desafiante que a nossa geração já
viveu”. E não apenas pela pandemia: o ano “foi sucessivamente lan-
çando uma série de desafios que culminaram com uma vindima abso-
lutamente fora do normal, com tanto de adversidade como de quali-
dade e, sobretudo, singularidade”, afirma. “O ano foi em geral quente
desde o seu início, levando a um avanço significativo das várias fases
fenológicas logo desde o abrolhamento”. Na primavera registou-se
“precipitação acima da média [que] levou a uma grande pressão de
míldio, prejudicando também em parte a floração, com consequentes
quebras numa produção que já à nascença não era demasiado gene-
rosa”. As previsões quantitativas do ano foram desde cedo “modestas
e agravadas com o escaldão ocorrido de 22 a 24 de junho. Ainda
assim, os 20-25% de quebra prevista inicialmente viriam mais tarde a
revelar-se pecar por defeito”, assume.
O ciclo prosseguia com avanço de cerca de 10 dias em julho mas
“com uma progressão da maturação ainda assim aparentemente
normal, inclusive com a maturação fenólica a evoluir muito favora-
velmente face aos açúcares”. Porém, “a entrada no último terço de
agosto marcou um ponto de viragem brusco - após uma chuva a 20
de agosto, aparentemente bem-vinda para ajudar a fazer face ao calor
estival e que numa primeira instância parece ter trazido algum ree-
quilíbrio das reservas hídricas para ajudar a terminar a maturação...
rapidamente o processo inverteu-se e começa a verificar-se uma desi-
dratação galopante nos bagos em diversas vinhas, com particular inci-
dência na Touriga Franca nas cotas mais baixas da região”.
Tiago afirma não conseguir, em mais de 20 vindimas no Douro,
encontrar paralelo para tal fenómeno, “e mesmo colegas com 50 anos
na região tampouco”. Até porque “calor no Douro não é propriamente
novidade” e “primaveras chuvosas” tinham-no sido mais “em 2016 e
2018”. E questiona-se se “a chuva de 20 de Agosto, face às condições
de calor e escaldão anteriores, terá provocado uma reação inesperada
e, em vez de refrescar e apaziguar, ter criado algum tipo de gradiente
de potenciais hídricos entre solo / videira / atmosfera motivando a
saída anormalmente acelerada de água dos bagos? É uma entre várias
explicações possíveis... mas ainda sem certezas e será sem dúvida
fundamental debruçarmo-nos sobre o sucedido, estudarmos e apren-
dermos, sobretudo num contexto de fenómenos climáticos cada vez
mais extremos e aleatórios”.
Quanto ao resultado da vindima, o enólogo da Quinta da Gaivosa
estima que “a quantidade sofreu uma quebra dramática, ultrapassando
em diversas vinhas os 50%, penalizando severamente os viticultores”.
No conjunto das vinhas das seis quintas da família Alves de Sousa a
quebra média foi de 35%, mas “com diversas vinhas a apresentarem
quebras efetivamente superiores a 50% e com o ligeiro equilibrar da

A variedade Loureiro mostra


desempenhos surpreendentes,


com níveis de acidez de


6,5 a 7 gr. de acidez e


12% à entrada da adega.


Também as castas Avesso


e Arinto apresentam bons


desempenhos.


@revistadevinhos outubro 2020 · 370 ⁄ Revista de Vinhos · 49

Free download pdf