50 CARLOS, A FACE OCULTA DE MARIGHELLA
em 1964, logo quando é solto, apareceu nas redações dos jornais de-
nunciando o tiro que havia sofrido. Retira o paletó e passa a apontar
o local onde a bala o atingira. Nota-se um abatimento pela prisão a
que se submeteu, mas também podemos verificar um pouco de seu
porte atlético. Evidentemente, nada que se aproxime de uma escultura
grega clássica, mas realça um porte físico cuidadoso. Clara ressalva
que esses hábitos de praticar exercícios eram circunstanciais, estava
muito ligado à conjuntura.
Marighella era fascinado por leitura; não foram poucas as vezes
que chegaria em casa com alguns livros e publicações. Lia de tudo. Do
pouco que o Partido Comunista assegurava a seus militantes, sempre
sobrava uma quantia para adquirir livros, tanto para si quanto para
presentear os amigos e parentes. Um costume que o acompanhava
desde a adolescência. Outro hábito mantido é a relação com a música.
Esta não ficou restrita a Salvador. O destemido militante comunista
tomava o cuidado de trabalhar escutando música, sua preferência,
nessas situações, era por ritmos rápidos, músicas como “Tico-Tico
no Fubá”, sucesso da década de 1940, facilmente ouvida nas rádios.
A relação com a música é eclética. Talvez por influência de Augusto
Marighella, tenha despertado seu interesse pela ópera. Juntamente
com os livros, sempre que podia comprava alguns discos. Contava com
o apoio de Clara Charf, que havia estudado piano em Alagoas. Além
de ópera, o comunista Marighella admirava o chorinho e a música
popular brasileira, sobretudo Noel Rosa.^58 O samba, por sinal, serviria
de inspiração no poema “Como Nasceu o Samba”, onde Marighella
explica, a seu modo, a origem do ritmo no Brasil:
“Dizem que o samba nasceu na Bahia,
mas dizem também que nasceu no Rio de Janeiro.
Vestiram a cidade com um vestido de nylon moderno,
(^58) Cf. depoimento de Clara Charf.