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Revista Época/Nacional - Colunistas
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas
Para parafrasear um ditado sobre os alemães atribuído
a Churchill, o grande problema de lidar com a China é
que ela sempre está ou a seus pés ou com uma faca
em sua garganta. Durante quase dois séculos, a China
foi humilhada pelas potências ocidentais, que criaram
enclaves em território chinês e impuseram suas leis.
Não por acaso a China submissa foi alcunhada de “o
homem doente da Ásia”, frase que ainda hoje enfurece
Pequim.
Essa época já passou, e a China agora é uma
superpotência: tem o maior Exército do mundo e em
breve terá a maior economia. Mas segue ressentida,
quer vingança pela humilhação e pretende impor sua
visão de uma nova ordem mundial, que não presume o
conceito da igualdade.
A China sempre foi uma sociedade altamente
hierarquizada, e continua assim. Quer ser o suserano
mundial — ou seja, nas palavras de Aurélio, deseja a
vassalagem de Estados aparentemente autônomos, tal
como existia na Ásia antes da chegada da primeira
missão comercial inglesa em 1793.
Isso ajuda a explicar a crescente agressividade da
China na área que considera sua esfera de influência.
Nas águas ao sul do país, apoderou-se de numerosos
recifes e ilhotas reclamados por Vietnã, Filipinas,
Malásia, Brunei, Taiwan e Indonésia, construiu bases
militares ali e ameaça cortar a navegação livre. Pior
ainda, estão em marcha genocídios culturais e
religiosos contra dois povos historicamente soberanos
que a China comunista e ateia engoliu — os tibetanos
(budistas) e os uigures (muçulmanos).
São comportamentos e crenças completamente
antagônicos aos valores brasileiros. O Brasil é um país
que preza a igualdade e o pluralismo — a diversidade
de religiões, ideologias, raças e modos de viver.
Valoriza a negociação em lugar do emprego de força
bruta. Claro que não cumpre sempre com essas
aspirações, porque, como os EUA, é composto de seres
humanos falíveis. Mas abraça uma multiplicidade
louvável.
O problema fundamental na relação Brasil-China, então,
não está na atitude de Bolsonaro, mas na incapacidade
chinesa de tratar outros Estados de igual para igual ou
absorver críticas. Bolsonaro gosta de briga, sim. Mas o
que é melhor para o Brasil: um presidente desconfiado
que protege a soberania nacional com zelo excessivo
ou a postura ingênua de Lula e o Partido dos
Trabalhadores, que falavam de “cooperação sul-sul” e
faziam vista grossa aos abusos dos direitos dos
trabalhadores chineses?
Defender liberdade de expressão, religião ou comércio
não é só um valor “americano”. É brasileiro também. Ao
preconizar tais virtudes, o Brasil não está se
posicionando como subjugado nem aliado dos EUA.
Está simplesmente afirmando seus próprios princípios e
tradições.
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-
Econômico - Colunistas