Exame Informática (Junho 2020)

(NONE2021) #1
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EDIÇÃO 300

Desde 2004 que há pessoas que têm vidas
saudáveis com bexigas produzidas a partir
de culturas celulares – ou, se se preferir
uma descrição mais precisa, bexigas que,
em vez de terem crescido no corpo humano,
desenvolveram-se in vitro, com células
extraídas dos pacientes. Anthony Atala,
investigador americano da Wake Forest School
of Medicine, foi o responsável pela produção e
implante dessas primeiras bexigas – mas não
parou desde então, tendo apurado diferentes
técnicas para vários órgãos. “As estruturas
planas como a pele são as menos complexas.
No segundo nível de complexidade, estão as
estruturas tubulares como os vasos sanguíneos
ou a uretra. No terceiro nível de complexidade,
encontram-se os órgãos que são ocos e
com formas irregulares, como a bexiga ou o
estômago. E os mais complexos são os órgãos
sólidos como o coração, o fígado ou o pulmão”,
explicou à Exame Informática, numa passagem
por Lisboa. Atala também admite que ainda
não conseguiu produzir pâncreas ou nervos in
vitro. Nestes casos mais complexos, a solução
poderá passar pela produção de subunidades
para testes de medicamentos ou substituição
de parte de um órgão doente. Além das células
estaminais, que exige um processo mais
complexo, a produção de órgãos in vitro recorre
à extração de células do próprio órgão que se
pretende substituir – e por isso evita os riscos
de rejeição. Com uma comunidade cada vez
mais envelhecida, fica aberto o caminho para
as primeiras fábricas de órgãos: “É algo que
vai acontecer. A única questão é quando e não
se. Diria que talvez possa acontecer dentro
de 10 anos”, refere Pedro Costa, responsável
da Biofabics, startup portuense que tem como
modelo de negócio a produção de órgãos
microscópicos. “Será necessária regulação.
Mesmo que alguém conseguisse produzir
agora um coração, talvez só dentro de
uns quantos anos poderia implantá-lo em
doentes no circuito convencional”, acrescenta
Pedro Costa, recordando que, até à data,
os implantes de órgãos in vitro só foram
autorizados nos casos em que não havia
mesmo alternativa melhor. H.S.


Dos mais de 17 mil TeraWatts consumidos anualmente no
mundo, apenas 453 TW provêm da energia do sol e 1,1 mil TW
têm origem no vento. Os dados compilados pela Vaclav Smil
(2017) e a BP Statistical Review of World Energy revelam que,
entre 1965 e 2018, a parcela correspondente às energias
renováveis não tem parado de aumentar, mas a larga maioria
dos dispositivos eólicos ou fotovoltaicos “descarregam” a
eletricidade para a rede de distribuição – e o “salto” para a
autonomia energática tem sido protelado. Além das questões
regulamentares, o mercado de baterias de grande capacidade
de armazenamento tem evoluído de forma pouco uniforme.
Num primeiro momento, o aparecimento de baterias mais
robustas poderia ser encarado como um fator capaz de diminuir
a preponderância das redes de distribuição nas atividades
domésticas e industriais – mas a evolução tecnológica tem
revelado que, eventualmente, as empresas de distribuição de
eletricidade terão interesse em fomentar o uso dessas unidades
de armazenamento de energia, por questões de controlo
de fluxos de distribuição e produção consoante as horas de
maior ou menor consumo. Seguindo esta mesma lógica, um
carro elétrico tanto pode atuar como consumidor de energia
em horas de maior desafogo, ou tornar-se fornecedor da rede
nas horas de maior procura. Os próprios tarifários tenderão a
refletir estes padrões de consumo. Se se juntar a este fator
a crescente inclusão de funcionalidades em computadores,
telemóveis, robôs, eletrodomésticos, e máquinas industriais
que compõem a crescente parafernália mundial, depressa
se conclui que o consumo de energia tende a aumentar. O
que obriga ao desenvolvimento de soluções que garantem
a autonomia e multiplicam fontes de energia – e diminuem
as emissões de gases poluentes. Em paralelo com baterias
de iões de lítio com cada vez mais capacidade, têm surgido
tecnologias que levam ao desenvolvimento de baterias
de metais líquidos que prometem armazenar a energia
consumida por um condomínio ou uma aldeia. Notícias dos
últimos anos confirmam que Portugal já começou a marcar
posição no roteiro da evolução das baterias – não só pelos
resultados obtidos com eólicas e fotovoltaicas, mas também
na área da investigação. Maria Helena Braga, investigadora
da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, é
provavelmente o rosto mais conhecido em Portugal no que
toca à nova geração de baterias. Depois de uma passagem
pela Universidade do Texas, EUA, para trabalhar com o
laureado do Nobel da Química John B. Goodenough, a
investigadora nortenha anunciou o desenvolvimento de
baterias de iões de lítio com eletrólitos em estado sólido – o
que promete reduzir a probabilidade de explosão. “As baterias
vão deixar de ser só baterias. Vão passar a incluir não só
uma reação química, para passarem a aproveitar também o
armazenamento eletroestático, tal como os condensadores”,
refere. A especialista acredita que o armazenamento de
energia vai pautar-se cada vez mais por sistemas híbridos
e complementares que são mais baratos e seguros e até
poderão ser indispensáveis para alimentar sensores da
atividade corporal. A proliferação de antenas 5G também
poderá dar um impulso inesperado: Até porque “cada antena
dessas vai precisar de uma unidade de armazenamento de
energia”, recorda Maria Helena Braga. H.S.

ÓRGÃOS VITAIS


AUTONOMIA PRECISA-SE

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