Banco Central do Brasil
Revista Veja/Nacional - Economia
sexta-feira, 12 de março de 2021
Banco Central - Perfil 1 - Banco Central
modelo similar ao adotado pela Suécia. Mais importante
que tudo isso, a PEC cria um seguro do governo contra
o próprio governo. Bolsonaro tem demonstrado uma
nítida guinada populista em questões econômicas,
intervindo mais na área de Guedes, nos últimos tempos
— um movimento que, segundo analistas, pode se
intensificar com a volta de Luiz Inácio Lula da Silva à
arena eleitoral. Agora, tanto Bolsonaro como os
próximos presidentes da República serão travados em
seus arroubos perdulários de cunho eleitoreiro quando a
conta chegar aos 95% de gastos obrigatórios.
Neófito nos princípios do liberalismo e com forte
tendência a atender aos apelos corporativistas de sua
base política, Bolsonaro colocou a PEC em risco
algumas vezes em sua tramitação. Na última semana, o
presidente indicou que gostaria de retirar os
profissionais de segurança pública, como policiais e
delegados, do alcance da PEC. Chegou, ele próprio, a
vocalizar os interesses da bancada da segurança,
formada por cerca de cinquenta deputados, que exigia
mudanças no texto. “Da minha parte, falei com o relator
que ele poderia correr risco de não aprovar (a PEC) se
não mexesse em três artigos”, disse na segunda-feira. A
declaração ameaçou o projeto e, para evitar o desastre,
Arthur Lira (PP-AL) entrou em cena e se reuniu no dia
seguinte com o relator do projeto, o deputado Daniel
Freitas (PSL-SC), e líderes de partidos. Até o senador
Flávio Bolsonaro foi chamado para resolver a questão
junto ao pai. O presidente do Banco Central, Roberto
Campos Neto, muito respeitado por Bolsonaro e seus
seguidores, se dedicou a explicar aos congressistas que
essa iniciativa causaria mal-estar no mercado,
aumentando as pressões para uma alta da inflação e
dos juros. Campos de certa forma assumiu um papel
que seria de Guedes, mas o ministro já estava
desgastado pelos embates na tramitação do projeto no
Senado. Na ocasião, a base do governo tentou retirar o
Bolsa Família da alçada do teto de gastos, o que abriria
espaço para liberar mais dinheiro para emendas de
parlamentares — isso teria deixado o mercado
financeiro em polvorosa.
Tamanha articulação levou à aprovação do texto-base
da PEC no mesmo dia, em primeiro turno na Câmara,
sem nenhuma alteração em relação à versão aprovada
na semana anterior no Senado. Imediatamente, policiais
iniciaram uma gritaria em defesa de seus interesses,
ameaçando greve e chamando Bolsonaro de traidor. Na
votação dos destaques, na tarde de quarta, o governo
sofreu um baque quando, a partir de um destaque do
PDT, se derrubou um dispositivo que eliminava a
vinculação de receitas com impostos a fundos, órgãos
ou a despesas específicas e beneficiava diretamente a
Receita Federal e seus servidores. A medida tinha
pouco impacto no contexto da PEC, mas acionou um
sinal de alarme sob a justificativa de que era importante
evitar novas derrotas, principalmente no caso de um
outro destaque, esse apresentado pelo PT, que
derrubava as restrições ligadas ao congelamento dos
salários do funcionalismo.
Os cinquenta deputados ligados às forças policiais, a
chamada bancada da bala, já se mostravam dispostos a
votar o destaque petista quando o líder do governo na
Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), negociou um acordo
em plenário. A proposta do PT seria derrubada, mas o
governo se comprometia a apoiar no segundo turno,
realizado no dia seguinte, outro destaque que manteria
as promoções e progressões de carreira do
funcionalismo, mas bloqueava os aumentos salariais
automáticos. “Foi-se um braço, mas preservou-se o
corpo”, resumiu Freitas a VEJA.
Em termos de impacto fiscal, a equipe econômica
considerou a concessão um movimento bem-feito e de
resultado positivo. Manter a progressão dos cargos
reduz a economia em 1,5 bilhão de reais ao ano,
segundo estimativas de mercado. Mas a contenção dos
demais reajustes que foi aprovada tem impacto de 15
bilhões de reais por ano. Em dois anos, são 30 bilhões
de reais, o que já cobre parte importante dos gastos de
44 bilhões de reais com o auxílio emergencial. “Não
desidrata completamente a PEC, o governo entendeu
como uma boa barganha e o mercado aceitou”, analisa
Marilia Fontes, sócia-fundadora da consultoria de