90 WOMEN’S HEALTH / Julho 2019
ILUSTRAÇÃO: EASTNINE INC. / GETTY IMAGES
M
inha
primeira
manifestação
preocupante de
crise de ansiedade
ou pânico se deu
aos 5 anos de idade.
Clamava à minha
mãe de coração
acelerado: eu tinha
medo de morrer. Fiz
os exames pedidos
pelo cardiologista e
não tinha “nada”.
Dez anos se
passaram e, no fervor
da adolescência, tive
vários episódios.
Medo de tudo e de
todos. Aos 15, eu me
vi embaixo da cama
com medo de sair de
casa e de decepcionar
meus pais. Foi aí que
minha mãe viu que
eu não estava bem de
verdade. Comecei
uma terapia, mas
eu só mentia, pois
queria ter alta. Um
ano depois, após
decidir largar, a
psicóloga chamou
minha mãe para dizer
que eu tinha uma
depressão profunda.
A cada aprendizado
novo, uma luzinha
acendia no meu
cérebro. Eu, depressiva
que sou, consegui
vibrar — e foi demais”
A comunicadora Amanda Ramalho, de 33 anos,
conta como aprender um novo instrumento e entrar
em uma banda a ajudou a lidar com a depressão
AMANDA RAMALHO apresenta o podcast
Esquizofrenóias, sobre saúde mental, e toca na
banda Elas Não Falam Top, das alunas da
escola de música School of Rock, que promove
o aprendizado aliado ao desenvolvimento
pessoal, através da oportunidade de montar
bandas e apresentar shows
Aos 26 anos, tentei
suicídio. Não morri.
Ainda bem.
Ano passado,
tomei a decisão mais
importante da minha
vida: deixei meu
trabalho de quinze
anos (o único que
tive) para me dedicar
ao meu projeto de
saúde mental. Foi
um turbilhão. Junto
à decisão veio a
oportunidade de
fazer aula de guitarra
na escola de música
School of Rock. Eu
teria um hobby, justo
eu que nunca amei
nada de verdade (por
conta da depressão).
Sempre quis tocar
um instrumento, ter
uma banda. Já tive
muitas bandas. Todas
na minha imaginação.
Aulas? Tentei durante
a infância e na
adolescência mas, por
conta da ansiedade,
desistia na primeira
dificuldade. “Você
não é capaz”, dizia
a voz constante na
minha cabeça que, por
acaso, era a minha.
Admito que no
começo eu estava
apavorada. Tinha
medo de chorar nas
aulas particulares,
nos ensaios, de
atrapalhar as
outras meninas da
banda. Medo de
não ter ritmo, de
incomodar. Medo
de ser um fracasso.
Não sabia que eu
era capaz. Pois fui –
ou me tornei. Aprendi
a amar o instrumento
e vibrar com minhas
mínimas evoluções.
Um pensamento
recorrente que
eu tinha: estou
exercitando uma
parte nova do meu
cérebro. A cada
aprendizado novo,
uma luzinha acendia
naquela área. Eu,
depressiva que sou,
consegui vibrar
- e foi demais.
Veio então a
apresentação,
o show ao vivo.
Tive uma crise de
ansiedade fortíssima
cerca de cinco dias
antes. Achei que
não conseguiria.
Meu terapeuta me
lembrou das coisas
difíceis que passei,
até mesmo no meu
antigo trabalho:
“Você trabalhava
com humor. Seja
leve”, disse ele,
“entre no seu próprio
personagem”.
Foi o que fiz.
Na vida “real” sou
reservada, muitas
vezes calada até
demais. Acham
estranho, pois
trabalho com
comunicação – eu
não sei a explicação
para isso nem preciso
saber. Subi no palco,
encarnei minha
persona, brinquei
com a plateia. Fiz um
show – literalmente - e dessa vez não
foi imaginário.
Nunca é tarde para
começar nada. •
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