COMBO SAUDE - VOLUME 1

(O LIVREIRO) #1

o


“Voltei a trabalhar
assim que fui liberado
petos infectologistas.
Só consigo pensar
em ajudar os outros.
Não quero que outras
famílias percam
seus entes queridos.
Estamos trabalhando
cada vez mais perto do
limite e em operação
de guerra. Estamos
todos cansados,
machucados... A falta
de equipamentos de
proteção individual
(EPIs)é visível. Os
leitos estão sendo
gerenciados da melhor
maneira possível, mas
sabemos que eles são
finitos. É questão de
tempo até o sistema
de saúde entrar em
colapso. Acredito que as
pessoas só começarão
a tomar consciência
da triste realidade
quando essas mortes
deixarem de ser apenas
números e se tornarem
nomes conhecidos.
Quando tiverem o seu
sobrenome. È triste,
mas o ser humano
tende a aprender
apenas quando passa
por algum sofrimento.
Vamos passar por
isso. Vai dar certo,
mas precisamos
estarjuntos/'

Douglas Sterzza Dias
medico, 28 anos, perdeu a
mãe e a avô para a Covid- 19

Se a pandemia fosse uma guerra, a médica
Anna Poloni, de 33 anos, estaria no front. Ela tra-
balha na emergência de três hospitais de São Pau-
lo, o epicentro da doença no Brasil — são mais de
30 mil casos confirmados e 2 mil mortes até 5 de
maio. Anna lutou bravamente contra o coronavi-
rus até o dia 18 de março, quando foi diagnostica-
da. Com a piora de seu estado de saúde, chegou a
ficar dois dias na UTI do Hospital Santa Paula,
onde trabalha, e ser atendida por colegas. Ao
todo, foram 16 dias de internação. “O fato de ser
médica não me ajudou a lidar melhor com a situa-
ção. Tive medo como qualquer um. De super-he-
róis não temos nada", avalia.
No dia 3 de abril, Anna vestiu o jaleco. pendu-
rou o estetoscópio no pescoço e voltou ao baten-
te. Um de seus temores é, durante o plantão, aten-
der algum amigo, parente ou colega de trabalho.
Pior: na falta de leitos ou dc respiradores, ter que
escolher, entre dois ou mais pacientes, quem é o
mais grave, ou tem mais chances de sobreviver, e
manda-lo para a UTI. "Muitas pessoas não estão
levando essa doença a sério. Não fazem ideia dos
riscos que estão correndo'‟, afirma.
Diferentemente de Anna, o cirurgião vascular
Douglas Sterzza Dias, de 28 anos, não precisou ser
internado. Apesar do contato com o vírus, seu so-
frimento foi outro: o impacto da infecção na famí-
lia. A mãe, Rita, de 55 anos, e a avó materna, Irace-
ma, de 85, não resistiram à doença. Com histórico
de diabetes, hipertensão e obesidade, morreram
em menos de 72 horas. "Por lidar com pacientes
graves, a morte torna-se algo natural. Mesmo as-
sim, quando acontece com pessoas tão próximas e
em tão pouco tempo, você não consegue estar pre-
parado. Choro todos os dias”, admite.
Na sexta, 27 de março, ele cumpria o isolamento
domiciliar quando recebeu uma ligação do Hospi-
tal São Paulo pedindo que reconhecesse o corpo da
mãe. Do necrotério, seguiu, sozinho e de máscara,
para o Cemitério Parque dos Pinheiros, na capital
paulista. Na hora do sepullamento, não leve a
quem abraçar ou com quem dividir sua dor. Na
quinta. 2 de abril, retornou ao trabalho. "Estamos
trabalhando no limite. É uma operação de guerra.
A falta de equipamentos de proteção individual
(EPIs) é visível. 6 questão de tempo até o sistema
de saúde entrar em colapso”, alerta.

A esta altura, talvez você se questione: onde e
como tantos brasileiros pegaram o vírus Sars-


  • CoV-2? Mas a pergunta, refletem os especialis-
    tas, perdeu o sentido desde que a transmissão co-
    munitária do patógeno se alastrou por cidades e
    nações. As medidas de isolamento e proteção têm
    sua razão de ser: hoje, o coronavírus pode estar li-
    teralmente por todos os cantos e, em tese, qual-
    quer cidadão circulando por ai corre o risco de ser
    diagnosticado com ele. Um dos momentos mais
    tensos entre quem pegou, aliás, é a confirmação
    do diagnóstico. É o que garante a advogada Da-
    niela Teixeira, de 48 anos. Quando testou positivo
    no dia 16 de março, sentiu o chão se abrir debaixo
    de seus pés. “É um momento de terror, quase uma
    sentença”, compara.
    Daniela acredita ter contraído o vírus no início
    de março em um congresso em Fortaleza. Uma se-
    mana depois, mesmo assintomática, resolveu fa-
    zer o teste. Não deu outra. Entrou em quarentena,
    ao lado do marido e dos dois filhos, de 17 e de 6
    anos, em Brasília. "Não poder dar banho na caçu-
    la foi a parte mais triste”, conta. Durante o confl-
    nainento, restringiu o tempo dedicado às redes
    sociais e retomou alguns hobbies. como ouvir mú-
    sica. maratonar séries e cuidar do jardim. No dia
    24, voltou a íazer o teste. Desta vez, estava recu-
    perada. "De gripezinha não tem nada. Quando
    você está gripado, não tem erro: em uns sete dias,
    está tudo bem. Com a Covid-19. você não sabe o
    que vai acontecer daqui a meia hora. É desespera-
    dor", recorda.
    Para quem se infectou com o coronavírus, há
    dois tipos de “alta”: a laboratorial e a clínica. Na
    laboratorial, exames detectam a presença dc anti-
    corpos e a ausência do vírus. Na clínica, os sinto-
    mas já estão ausentes há algum tempo. A médica
    Raquel Stucchi, consultora da Sociedade Brasilei-
    ra de Infectologia (SRI) e professora da Universi-
    dade Estadual de Campinas (Unicamp), explica
    que, se o paciente estiver há mais de sete dias sem
    sintomas, como febre ou tosse, já pode ser consi-
    derado curado. No entanto, ele ainda pode trans-
    mitir o vírus. "O ideal é que. até completar 14 dias
    do inicio dos sintomas, o paciente não saia dc casa
    porque tem risco aumentado de transmissão. Se
    tiver que sair, é importante que use máscara”, re-
    comenda a infectologista. ©


56 VEJA SAUDE MAIO JOÍQ^

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