João Gabriel de Lima - Um crime, um recorde e uma perspectiva
Banco Central do Brasil
O Estado de S. Paulo/Nacional - Política
sábado, 13 de novembro de 2021
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Autor: João Gabriel de Lima
Uma campanha agressiva realizada em 2006 teve
função civilizatória no Brasil. Na ocasião, o Greenpeace
divulgou um estudo mostrando como a produção
brasileira de soja contribuía para o desmatamento na
Amazônia. Foi o ponto de partida para um pacto
chamado 'moratória da soja', em que empresas
produtoras de alimentos, como a Cargill, e cadeias de
lanchonetes, como o McDonald's, se comprometeram,
respectivamente, a não desmatar e a não mais comprar
insumos oriundos do desmatamento. Deu certo. A
agricultura brasileira da soja passou a crescer por
aumento de produtividade. Quando precisou se
expandir, segundo estudo da rede acadêmica Climate
Policy Initiative, foi sobre pastagens, e não florestas. 'A
agricultura brasileira não precisa de novas terras, e
ganhamos mais com a floresta em pé', diz o economista
Juliano Assunção, um dos autores do estudo. Ele é o
entrevistado do minipodcast da semana.
Apenas em uma das cinco regiões do Brasil esse
padrão não se verifica: o Norte, justamente onde se
situa a maior parte da Amazônia. 'Lá não se cortam
árvores para instalar agricultura ou pecuária relevante.
É crime mesmo, que tem que ser combatido', diz
Assunção. O estudo mostra que o desmatamento que
nesta semana bateu novo recorde, segundo dados do
Inpe não gerou nenhuma atividade econômica
importante na região. 'Na Indonésia se desmata para
produzir óleo de palma. No Brasil, o criminoso coloca
bois em áreas griladas para fingir que tem alguma
atividade econômica, mas não gera riqueza nem
emprego', afirma Assunção.
O que fazer, então, para criar emprego e riqueza na
região? Assunção é um dos coordenadores do projeto
Amazônia 2030 - que pretende, entre outras coisas,
responder a esta pergunta. O Amazônia 2030 acaba de
lançar estudo - anexado à versão digital desta coluna -
que lista perspectivas, por exemplo, na produção de
cacau, mandioca e mel. Os autores olham para os
imensos desafios de desenvolver atividades produtivas
numa região isolada, e propõem soluções.
A Amazônia foi assunto central na COP-26 de Glasgow.
Consolidaram-se algumas convicções anunciadas nos
estudos. A devastação da floresta não gera riqueza. O
agronegócio não precisa invadir a Amazônia para
crescer. É possível criar atividades econômicas
sustentáveis na região, embora seja desafiador. E
campanhas ambientalistas agressivas ajudam a mover
pactos que unem governos, setor produtivo e sociedade
civil. Precisamos da Amazônia para ter alguma
relevância no mundo, e só será possível mantê-la com a
participação - mesmo que com uma parcela de conflito -
de diversos atores.
ESCRITOR, PROFESSOR DA FAAP E DOUTORANDO
EM CIÊNCIA POLÍTICA NA UNIVERSIDADE DE
LISBOA
COLUNISTAS
Assuntos e Palavras-Chave: Cenário Político-