O caso é que, em 1938, Forster podia ter alguma confiança de que
ninguém ia pedir a ele que escolhesse entre trair uma amizade ou trair
uma causa política. Agora que todos os dias vemos pessoas rompendo
publicamente com membros da família por causa de opiniões políticas,
podemos ter a mesma confiança?
Veja por exemplo o caso de Patton Oswalt e Dave Chappelle, dois cômicos
americanos. Ano passado Dave Chappelle gravou um especial para a
Netflix em que fez algumas piadas com transexuais. Vi esse especial.
Essas piadas foram tão inteiramente benignas que não provocariam a ira
de Hitler, se Hitler fosse transexual. Não estou exagerando. Se essas
piadas fossem ouvidas por um conselho formado pelas versões
transexuais dos personagens mais irritáveis que já existiram (o deus
Júpiter, o Hulk, o Pato Donald, o Diabo da Tasmânia, o Wolverine, o Ren do
Ren & Stimpy, e o Moe dos Três Patetas) nenhum deles se irritaria. Mas os
transexuais da vida real, ou pelo menos da internet, se irritaram, e
pediram a cabeça de Dave Chappelle.
Na noite do Ano Novo, Patton Oswalt, comediante, guia moral de toda
uma geração e a voz do ratinho em Ratatouille, postou no seu Instagram
uma foto de si mesmo abraçado em Chappelle. “Que bom encontrar um
velho amigo”, escreveu ele inocentemente. Foi muito xingado. Quer dizer,
imagino que tenha sido muito xingado, embora no Instagram só
apareçam comentários reclamando que ele apagou os xingamentos.
Podem ter sido só três xingamentos, pelo que dá pra descobrir. Não
importa: em menos de 24 horas ele já tinha postado um pedido de
desculpas por ter postado a foto com seu amigo Chappelle: