Devia ser isso que o pessoal da cidade dizia a seu respeito, que ela mal falava a
língua deles.
Tate não pôde evitar encará-la. Ela devia estar com treze ou quatorze anos,
pensou. Mesmo com essa idade, porém, tinha o rosto mais impressionante que ele
já vira. Os olhos grandes quase pretos e o nariz fino acima dos lábios bem
desenhados lhe davam um ar exótico. Ela era alta e magra, o que lhe dava um
aspecto frágil e flexível, como se houvesse sido moldada pelo vento. No entanto,
era possível notar uma musculatura jovem e forte, de potência discreta.
O impulso de Kya, como sempre, foi sair correndo. Mas houve outra sensação.
Uma plenitude que ela não sentia fazia anos. Como se algo morno houvesse sido
derramado no seu coração. Ela pensou nas penas, na vela de ignição e nas
sementes. Tudo poderia terminar se ela saísse correndo. Sem dizer nada, ergueu a
mão e estendeu para ele a pena elegante de cisne. Bem devagar, como se ela
pudesse sair em disparada como um veado assustado, ele se aproximou e observou
a pena estendida na sua mão. Ela ficou em silêncio olhando apenas para a pena,
não para o rosto dele, nem para qualquer lugar perto dos seus olhos.
— Cisne-pequeno, né? Incrível, Kya. Obrigado — disse ele.
Ele era bem mais alto do que ela, e curvou-se ligeiramente ao pegar a pena da
sua mão. É claro que aquele era o momento de Kya agradecer pelos presentes,
mas ela ficou calada desejando que ele fosse embora, desejando que os dois
pudessem se ater à brincadeira.
Tentando preencher o silêncio, ele continuou falando:
— Foi meu pai quem me ensinou das aves.
Por fim, ela ergueu os olhos para ele e disse:
— Eu não consigo ler seu bilhete.
— Bom, claro que não, você não foi à escola. Eu esqueci. O bilhete só dizia
que eu tinha te visto uma ou duas vezes pescando, e pensei que talvez a vela de
ignição e as sementes pudessem ser úteis. Eu tinha algumas sobrando, e achei que
poderia poupar uma ida à cidade. Imaginei que fosse gostar das penas.
Kya baixou a cabeça e disse:
— Obrigada por elas. Foi gentileza sua de verdade.
Tate reparou que, embora o rosto e o corpo dela exibissem os primeiros
indícios e curvas da idade adulta, o comportamento e o modo de falar eram um
pouco infantis, contrastando com os das meninas da cidade, cujo comportamento
— maquiagem exagerada, palavrões, cigarros — superava em muito as suas
curvas.
— De nada. Bem, é melhor eu ir andando, está ficando tarde. Vou aparecer de
vez em quando, se você não se importar.
Kya não respondeu. O jogo devia ter acabado. Assim que ele entendeu que ela
não ia falar mais nada, balançou a cabeça, tocou o boné com a mão e virou-se
para ir. Mas, quando estava abaixando a cabeça para passar pelos arbustos, tornou
a olhar para ela.
— Eu poderia ensinar você a ler, sabe?
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1