Escola da Noite

(Carla ScalaEjcveS) #1

providência. Tolerava-se tudo, desde que fosse regulamentado. Por isso, quando
a caçada começasse, ela passaria de bom grado pela polícia para falar aos
agentes do americano que tinha conhecido e que se estava a preparar para
comprar um rancho nas Pampas maior do que Rhode Island. Uma espécie de
compensação, diria ela. Uma coisa para o levar a sério. Porque nunca se
mostrara verdadeiramente duro. E depois os polícias, sendo alemães, apontariam
tudo e, a seguir, ligariam a alguém conhecedor e, dessa forma, descobririam que
um rancho nas Pampas maior do que Rhode Island era uma compra muito
dispendiosa.
Uma simples pesquisa das transações imobiliárias correntes num único país
do mundo levá-los-ia à porta da casa dele novinha em folha.
Estúpido.
Tudo por culpa própria.
Mentalmente, deslocou-se pelo quarto, recordando os passos que tinha dado,
enumerando aquilo em que tocara. O que não era muito, tirando ela. Teria as
impressões digitais na pele dela? Duvidava. E, em todo o caso, estariam
esborratadas. Tinha o ADN no estômago dela, mas estava a ser atacado por
ácidos e enzimas digestivas poderosos. E a ciência ainda estava na infância.
Ainda na fase de relações-públicas. Não se avançaria com um caso, sob pena de
um fracasso público.
Tranquilo.
O que era uma loucura.
Mas também lógico. Perdido por cem, perdido por mil. Ou tudo ou nada.
Estava decidido. Tinha-se interrogado qual seria a sensação. Veio a revelar-se ser
igual a estar a cair. Como saltar de paraquedas, talvez. A longuíssima queda livre
antes de o paraquedas se abrir. A cair sem parar. Não foi capaz de resistir. Tudo o
que conseguiu foi respirar fundo, descontrair e render-se.
Tinha saído do hotel sem que ninguém o visse, pelo parque de
estacionamento. Por nenhuma razão, só um atalho para outro bar que conhecia.
E ela estava a chegar de carro, pronta para começar a trabalhar. Início da noite,
gente sofisticada e gastadora. Um mundo diferente. Mas agora já não. Ele podia

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