Me dá minha pinga! | 99
na nuca do “do meio”. O menino saiu catando cavaco
e acabou caindo na calçadinha de cimento grosso ra-
lando o joelho.
- Cê tá querendo matá o menino?! gritou o Deusdety.
- Ocê já viu pé de choca matá pinto? gritou a esposa.
Descarregaram a mudança e enquanto a mulher colocava a
tralha no lugar Deusdety saiu pra reconhecer as redondezas. Esta-
va com a alma feliz. Sentia que as coisas iriam dar certo desta vez.
Tinha que comemorar. No primeiro boteco tomou um copo de
vinho licoroso, no segundo uma cerveja quente, no terceiro quar-
to e quinto tomou uma ou duas cachaças em cada um. Lá pelo
sexto ou sétimo boteco já estava no centro mais antigo da peque-
na cidade alagoana.
Entrou pisando firme no chão de tábuas, manchadas pelas
cusparadas dos bêbados e pelas gotas de pinga que todos jogam
“pro santo” antes de virarem o copo pela goela abaixo, e as tábuas
rangiam sob sua botina de sola de pneu. Haviam dois fregueses
sentados cada um em uma mesinha com um copo de pinga à fren-
te. Um era cego e outro aleijado de uma perna, talvez uma picada
de cobra.
Deusdety bateu com a mão espalmada sobre o balcão e falou
alto:
- Me dá uma pinga, seu Zé!
- Não me chamo Zé e não sirvo pinga pra bêudo! emendou o
dono do bar.
- Então eu vou tomar a pinga do ceguinho e a do aleijado!
Quando deu um passo em direção ao ceguinho e a tábua do
assoalho rangeu, ele depressa virou o copo de pinga na boca e
engoliu de uma vez. Virou-se para a mesa do aleijadinho e a cena
se repetiu, lá se foi a pinga goela abaixo!
A esperteza dos dois irritou-o muito. Deu uns sopapos no
ceguinho e uns pontapés no aleijado que aprendeu a correr rapidi-
nho. Sentou-se e ficou segurando a cabeça entre as mãos com o
olhar fixo em uma garrafa de pinga da prateleira. Dali a pouco
chegaram esbaforidos dois soldados da cadeia, vieram arrastando