® Piauí ed. 185 [Riva] (2022-02)

(EriveltonMoraes) #1

estágio específico de uma doença avançada e dispostas a tomar um medicamento
experimental. O processo de recrutar o número necessário de pacientes demorava anos.


Por outro lado, projetar a fase 1 para uma vacina contra o coronavírus deveria ter sido
moleza. A BioNTech poderia atrair voluntários saudáveis na comunidade e só
precisava monitorar os efeitos colaterais, a serem registrados pelos participantes em
diários e informados em conversas telefônicas com os pesquisadores. Quando a
empresa terceirizada alemã responsável por realizar o ensaio com as vacinas
candidatas a combater a Covid-19 convocou voluntários pelo Facebook, mais de mil
pessoas se apresentaram em um único dia. Algumas até ligaram para a recepção da
BioNTech e imploraram para participar do estudo. Encontrar sujeitos dispostos não era
um problema.


Mas ainda havia obstáculos suficientes pela frente.


Em primeiro lugar, a empresa não tinha pessoal suficiente para preparar esses estudos
nem mesmo no segmento de oncologia. Em janeiro de 2020, Özlem havia selecionado
currículos para ampliar o grupo de gestores médicos e desenvolvedores clínicos da
BioNTech. No início do Projeto Lightspeed, as entrevistas com esses candidatos ainda
estavam acontecendo.


Como os compostos da vacina contra o coronavírus nunca tinham sido testados em
seres humanos, o ensaio também seria complexo. Os voluntários receberiam primeiro
doses muito baixas da vacina e, somente se fossem bem toleradas, uma dose mais alta
seria administrada aos demais participantes. Como Uğur e Özlem planejavam levar
algumas das vinte vacinas candidatas que estavam sendo testadas naquela época para
a fase clínica, o ensaio precisava avaliar a segurança e a tolerabilidade de cada
construto em doses crescentes, em diferentes grupos de idade, antes que a melhor
candidata e a dose correta fossem escolhidas para um ensaio combinado de fases 2 e 3,
a ser realizado pela Pfizer, com dezenas de milhares de indivíduos.


A terceirizada alemã encarregada da fase 1 teria de adaptar os processos rotineiros de
trabalho para que o estudo tivesse uma eficácia excepcional. No entanto, assim como a
maioria das empresas do país, não tinha expediente nos fins de semana. De forma
alguma era esperado que a equipe comparecesse aos sábados e domingos, mesmo em
um projeto crucial como esse. O esquema das doses precisou ser planejado com
cuidado, de modo que as principais datas para a revisão dos dados dos exames de
sangue não caíssem nos fins de semana.


Fora isso, havia a questão da comunicação e do treinamento. Entregar um novo
produto farmacêutico aos cuidados de médicos que vão conduzir um ensaio clínico é

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