® Piauí ed. 185 [Riva] (2022-02)

(EriveltonMoraes) #1

“Liguei várias vezes para Alex”, conta Uğur, que estava desesperado para saber o
desempenho das candidatas praticamente no mesmo instante em que chegassem a
Mainz. “Ele falava: ‘Uğur, me dê três horas.’ E depois: ‘Uğur, preciso de mais meia
hora’.” Então, em 29 de maio, pouco depois de uma da tarde, chegou um e-mail.


Alex tinha anexado na mensagem o primeiro conjunto de dados do ensaio clínico da
BioNTech. Ele testara o sangue de seis dos participantes que receberam duas doses de
10 microgramas do modRNA e de dois indivíduos que receberam 30 microgramas da
mesma formulação – essa plataforma gerava apreensão em Uğur e Özlem, que se
perguntavam se ela exigiria uma dose muito alta. Os anticorpos neutralizantes foram
medidos e comparados com a sorologia de pacientes recuperados da Covid-19; depois,
foram representados por dezenas de pontos agrupados na parte inferior de um gráfico
que, para os leigos, pareceria comum. Contudo, essa imagem significava um avanço
monumental na batalha da ciência para derrotar o implacável coronavírus. A candidata
colocava em ação os atiradores de elite do sistema imunológico apenas sete dias após a
conclusão de um regime de baixa dosagem – uma resposta ainda melhor do que a
observada em pacientes que sobreviveram a uma infecção natural por coronavírus.


Os resultados foram um alívio para a equipe do Projeto Lightspeed. Onze dias antes, a
Moderna tinha publicado os resultados de quatro voluntários do seu estudo de fase 1
com o modRNA. A empresa de biotecnologia norte-americana testara uma dose de 25
microgramas, mas a considerara insuficiente, então anunciou que ia tentar doses de 50
e de 100 microgramas. A BioNTech queria a todo custo evitar uma situação similar,
porque os relatórios sobre os participantes do ensaio alemão que receberam 100
microgramas do modRNA não apresentaram bons indicadores. Os indivíduos tinham
desenvolvido sintomas parecidos com os da gripe, como calafrios e febre. Alguns não
conseguiram levantar da cama. Para uma vacina que deveria ser administrada em
velocidade recorde, em todos os tipos de ambientes improvisados, isso estava muito
aquém do ideal. Quem recebesse a vacina teria de ser monitorado de perto durante
horas e, com certeza, muitos escolheriam pular essa parte. “O ideal era uma injeção que
pudesse ser dada no estacionamento do supermercado”, observa Özlem, que integrava
o comitê de quatro pessoas responsável por revisar os dados de segurança de Berlim e
Mannheim.


O painel decidira descontinuar as doses de 100 microgramas, mas os dados
preliminares enviados por Alex mostraram que essa resolução não afetaria o
surgimento de uma candidata funcional. Muito pelo contrário. “Naquele momento,
sabíamos que talvez 10, quem sabe 30 microgramas seriam suficientes”, diz Uğur.
Todas as otimizações de mRNA nas quais o casal e as suas equipes tinham trabalhado
ao longo dos anos estavam dando resultado. “O número de doses que éramos capazes

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