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Se o vírus da febre
aftosa escapar,
poderá se espalhar
rápido – e causar
US$ 50 bi em danos.
Para muitos especialistas, a questão não
é se as medidas antivazamento do NBAF
vão falhar, mas o que os Estados Unidos
vão fazer quando a peste suína africana
finalmente chegar. Em 2013, mais de 10%
do rebanho de porcos do país morreu
numa epidemia de diarreia suína – o
vírus veio nos sacos reutilizáveis usados
para transportar a ração. Os criadores
foram orientados a implantar protocolos
de desinfecção na entrada das fazendas,
proibir o acesso de visitantes de outros
países, e inspecionar as marmitas dos
funcionários para se certificar de que
não têm bacon ou salsichas.
Desde que as tropas do general
Myers descobriram a lista da Al Qaeda
numa caverna afegã, houve um enorme
investimento em pesquisas científicas,
mas pouco planejamento local. O sa-
crifício em grande escala de animais
infectados, que os especialistas chamam
de “atividades de despopulação”, pode
ser logisticamente muito difícil. Quan-
do o governo da Holanda teve de matar
quase 11 milhões de porcos, em 1997, a
única saída foi usar estações móveis de
eletrocussão (os animais eram forçados
a andar sobre uma placa de metal mo-
lhada enquanto recebiam uma descarga
elétrica na cabeça). Em 2015, 38 milhões
de frangos, patos e perus tiveram de ser
mortos em Iowa, nos EUA, por causa da
gripe aviária. Os lixões locais pararam
de aceitar as carcaças, por medo de se-
rem processados pelos vizinhos, e os
bichos mortos ficaram apodrecendo
nas fazendas.
Nos EUA, o governo indeniza os fa-
zendeiros pelos animais sacrificados.
Mas o problema está na divisão de res-
ponsabilidades e poderes entre os gover-
nos estaduais e federal. “Como você faz
para bloquear o sistema de transportes, e
garantir que animais doentes não estão
sendo movidos de um lado para outro
do país, infectando mais rebanhos?”,
pergunta Myers. “Que autoridade nós
temos para impedir isso?” Essas lacunas
- jurídicas, administrativas, logísticas,
financeiras – são perturbadoramente fa-
miliares. Porque são as mesmas questões
que atrapalharam o combate à Covid-19.
Ao longo da sua carreira militar,
conta Myers, ele participou de vários
exercícios em que agências do governo
simulavam uma resposta a epidemias em
animais. Todas as simulações tiveram
quase exatamente o mesmo desfecho:
com a doença saindo do controle, e a
USDA (ministério da Agricultura dos
EUA) pedindo socorro. “Quando nós
chegávamos ao ponto em que eles di-
ziam: ‘agora vamos falar com o Depart-
ment of Defense (DoD) para pedir ajuda’,
a simulação terminava”, diz Myers.
“Ridículo, certo? O exercício termi-
nava ali. E nós, do DoD, nunca pude-
mos treinar e determinar o que seria
necessário [para conter a doença]. É co-
municação, é segurança, são helicóp-
teros? O que é?”, questiona o general.
O NBAF pode ser a melhor aposta para
garantir que ninguém, nunca, terá de
saber o que acontece depois. S
Trecho do livro Until Proven Safe: The His-
tory and Future of Quarantine (“Até que se
prove seguro: a história e o futuro da qua-
rentena", não lançado no Brasil), escrito por
Geoff Manaugh e Nicola Twilley e publicado
nos EUA pela editora MCD/Farrar.
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