A Santa Aliança

(Carla ScalaEjcveS) #1

logo, as pessoas começariam a chamar a polícia. Marcus desejou que o corte de
energia se prolongasse por umas semanas, para que as pessoas tivessem tempo de
refletir, e sobretudo perceber que este mundo é uma construção bela e perfeita, uma
estrutura tão refinada e complexa que mais do que se justifica defendê-la da
maneira como Marcus se dispunha a fazer. Caso os cidadãos fossem lembrados
disso, provavelmente não se mostrariam tão hipócritas ao ouvir falar de traslados
ditos ilegais de pessoas, de Guantánamo, de tortura e ataques com drones, de
soldados e generais, de Marcus e Trane. Alguém tinha que matar os inimigos. Sim,
os inocentes muitas vezes pagavam pelos pecadores, mas esse era o preço. O preço
por esta sociedade. Era impossível defendê-la sem pagá-lo. Os inimigos já não
chegavam de uniforme e em formação militar; eles descansavam em quartos de
hotel; eram, por exemplo, uma jornalista disposta a pôr fogo no mundo, a
abandonar a segurança de milhões de pessoas normais e comuns por um idiota
como Brix.



  • Em frente, soldado – murmurou Marcus para si mesmo.

  • Disse alguma coisa, chefe?

  • Não.

  • Apresse-se – disse Trane.

  • Vou entrar.


“Discrição” era a palavra-chave. Num primeiro momento, Marcus ficou na
calçada do outro lado e passou em frente ao hotel. Registrou tudo o que pôde a
distância, na penumbra, tendo como iluminação apenas o luar e os faróis de um ou
outro veículo. A entrada tinha aspecto bem insignificante, sem nenhum letreiro
pretensioso dando as boas-vindas aos fregueses, sem nenhuma intenção de irradiar
confiança e amabilidade. Uma porta corrediça de vidro, rodeada de fachada
cinzenta e anônima, deixava bem claro que a melhor qualidade do hotel era o preço

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