negreiro.” “Peter von Scholten.” Só pelos sublinhados ficou logo evidente o que
tinha interessado àquele leitor tanto tempo antes de Eva: a participação da Casa
Real dinamarquesa no tráfico de escravos africanos. Também nisso, a monarquia
tinha manchado as mãos de sangue. E talvez estivesse aí o motivo de terem usado
tinta vermelha para sublinhar os trechos. Durante séculos, os reis dinamarqueses
tinham lucrado com o comércio de pessoas caçadas na África. Um sem-número de
africanos morreu durante a viagem da Costa do Ouro às Índias Ocidentais
Dinamarquesas.[14] Ninguém sabia quantos perderam a vida, mas sabe-se que tudo
era organizado pelo rei. O negócio em si tomou forma graças a uma Carta Régia de
Privilégios de 1671. Não é preciso dizer mais; ainda é possível admirar a assinatura
do rei no documento que deu o sinal de largada para a participação dinamarquesa
no capítulo mais negro da história da humanidade. E a conversa de que o país foi o
primeiro a abolir a escravidão? Besteira. O tráfico negreiro só fez aumentar depois
que se aprovou uma lei que pretendia abolir a escravidão no futuro. O rei e seus
conselheiros faziam apenas pose para o exterior, tentando satisfazer as numerosas
vozes, na Europa, que exigiam a abolição, mas aumentando ao mesmo tempo o
comércio de seres humanos. Nas possessões da Dinamarca, a escravidão só chegou
ao fim em 1848, quando um homem – Peter von Scholten – se rebelou contra o
rei. Foi castigado por isso.
Eva se reclinou na cadeira. Respirou fundo. Pegou outro livro, um daqueles que
eram críticos da monarquia. Virou-o e examinou na contracapa a foto da autora,
Tine Pihl, jornalista, escritora e palestrante. Eva a tinha visto na TV e nas revistas.
Era das detratoras mais combativas da Casa Real, uma mulher mordaz que não
estava disposta a deixar nada de lado, por mais que se escudasse atrás de um sorriso
aparentemente ingênuo. Eva folheou o livro. Apenas trezentas páginas, cujo
subtítulo prometia “um olhar excepcionalmente cortante sobre a face oculta da
família mais poderosa do país”. Retórica batida, mas funcionava. Eva ficou
fascinada. Leu por cima algumas páginas, pulou outras, mas leu profundamente
carla scalaejcves
(Carla ScalaEjcveS)
#1