Você SA - Edição 255 (2019-08)

(Antfer) #1

A


carteira vazia e
a incerteza de
quando isso mu-
dará compõem
um retrato da
atual situação
de Wander-
ley Júnior, de
39 anos. Com
duas décadas
de experiên cia
na área comercial e passagens por
empresas como Unilever e Makita,
o profissional está desempregado
há 14 meses. Sobrevivendo de bicos
que faz como marido de aluguel, em
que realiza pequenas manutenções
em residências, e como assistente
de produção de eventos, Wander-
ley viu seu padrão de vida mudar
radicalmente. “Tive de vender meu
carro para quitar o financiamento
do automóvel, e minha renda dimi-
nuiu cerca de 60%”, afirma.
Casos como o de Wanderley, infe-
lizmente, estão se tornando cada vez
mais comuns. Segundo a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad Contínua), até maio de 2019,
assim como o paulistano, outros

MERCADO

64 wAGOSTO DE 2019 wVOCÊ S/A FOTO: DANIELA TOVIANSKY

A crise econômica e a Gig Economy criaram uma legião de trabalhadores
sem carteira assinada no Brasil. Embora seja uma oportunidade de gerar
renda, a informalidade pode trazer prejuízos para toda a sociedade
Felipe Sakamoto e Lucas Cabral

CADA UM POR SI


40  milhões de brasileiros trabalha-
vam no mercado informal. O número
é 8% maior quando comparado ao
mesmo período do ano anterior. O
avanço da informalidade é um dos re-
flexos da crise econômica, que perdu-
ra no Brasil desde 2014. “A recessão e
o aumento do desemprego fazem com
que cresçam os subempregos: traba-
lhos sem vínculo empregatício cujas
principais características são a baixa
produtividade e a má remuneração”,
afirma Ruy Braga, pesquisador e pro-
fessor na Universidade de São Paulo.
Os dados comprovam essa realidade.
Em março, o número de desempre-
gados no Brasil atingiu a marca de
13,4 milhões de pessoas, segundo o
IBGE, enquanto a economia do país
retraiu cerca de 0,68%.
Nesse cenário, a informalidade
muitas vezes é a única opção para os
trabalhadores recém-desempregados,
incluindo pessoas com experiência e
formação superior, como Wanderley,
formado em ciências tecnológicas
pela Universidade Federal do ABC,
de São Paulo. “Na situação em que
estou hoje, sinto-me depreciado.
Existem muitos profissionais quali-

ficados aceitando cargos inferiores
aos que poderiam ocupar para ter
estabilidade. O último trabalho que
consegui não dava nem sequer para
pagar as contas do mês”, diz.
Com a reforma trabalhista, apro-
vada em 2017, os bicos ganharam
respaldo legal. Na nova legislação
há a previsão da modalidade de con-
trato em regime intermitente, pelo
qual as empresas podem admitir os
trabalhadores por horas, dias ou
meses específicos. Embora ofereça
a possibilidade de conseguir uma
ocupação com o mínimo de estabili-
dade, especialistas criticam a opção
por representar uma precarização
das condições de trabalho. De acor-
do com Bruno Ottoni, pesquisador
do Idados e do Instituto Brasileiro
de Economia da Fundação Getulio
Vargas (Ibre/FGV), a adoção desse
novo modelo, contudo, ainda não é
expressiva. “A falta de segurança ju-
rídica sobre esse tipo de contrato, já
que a legislação é recente e existem
muitos pontos que não estão claros,
faz com que as empresas se sintam
receosas em contratar mediante
esse regime”, afirma.
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