“Quando temos vivências traumáticas
ou desejos que não suportamos lembrar,
recalcamos esses fatos. Porém, ao chegar
ao inconsciente, esse material não fica
esquecido, pois existe um movimento
pulsional que faz essas lembranças virem
ao consciente em forma de impressões,
gerando, assim, as neuroses”
Claudia Brazil, psicanalista
Sistemas psíquicos
De acordo com a concepção freudiana, a mente
possui três estruturas: inconsciente, pré-consciente
e consciente. A primeira é composta por conteúdos
censurados ou reprimidos. Conforme ressalta a
psicanalista Júlia Bárány, trata-se da maior parte
da psique: libido, impulsos, desejos, apetites,
instintos, necessidades básicas e memórias estão
localizados nessa porção.
O pré-consciente é o limiar da consciência,
é aquele material acessível, mas que não enten-
demos totalmente ou não fazemos associações
diretas. Já a consciência se caracteriza por todos
os pensamentos, lembranças, raciocínios e pro-
cessos mentais que percebemos facilmente, estão
ao alcance de nossa compreensão. “O processo
de cura proposto pela psicanálise é, justamente,
tornar consciente o inconsciente, driblando os
mecanismos de defesa que nos fazem esconder
de nós mesmos os aspectos considerados inacei-
táveis”, explica a especialista.
Para regular a ação desses sistemas, existem
outras três instâncias: ego, superego e id. A
princípio, o ego funciona como uma espécie
de mediador, que regula os desejos internos
em relação à realidade externa. Já o superego
pode ser entendido como o julgador, a estrutura
encarregada da responsabilidade e da censura
do ego. Segundo Júlia, carrega os valores da
civilização e os comportamentos mais aceitos –
estão aí os constructos que formam as inibições
da personalidade.
“Freud descreve três funções do superego:
consciência (mas também age de forma inconscien-
te, gerando culpa ou vergonha, por exemplo, ou
ainda compulsões e proibições), auto-observação
e a formação de ideais”, acrescenta a psicanalis-
ta. Por último, o id é totalmente inconsciente,
carregando impulsos e forças que movem os
indivíduos. Dessa relação, entre os desejos, a
mediação e a censura, forma-se a personalidade.
Acesso ao inconsciente
Antes da formulação de sua própria técnica, inspirado pelo seu
colega, o médico austríaco Josef Breuer, Freud utilizou, entre os
anos de 1880 e 1882, a hipnose como método de tratamento, uma
vez que via no estado hipnótico uma forma de ter contato com as
ideias inconscientes. No entanto, abandonou a abordagem para
adotar, na psicanálise, a livre associação de ideias.
Nessa busca pelo contato com a parte mais profunda da mente
é que entram os sonhos na concepção freudiana. “A psicanálise
os entende como uma produção do inconsciente – através dos
mecanismos de condensação e deslocamento. Assim sendo, por
mais que dois indivíduos sonhem a mesma cena, ela terá, neces-
sariamente, interpretações diferentes para cada um”, esclarece
Virgínia Ferreira.
As situações elaboradas pela mente enquanto dormimos – assim
como os chistes (ou brincadeiras) e atos falhos – são manifestações
inconscientes. A Interpretação dos Sonhos (1900), dessa forma, é
considerada a principal obra do pai da psicanálise e um material
de referência até os dias de hoje.
Júlia Bárány também destaca que, nessa linha de reflexão, os
sonhos são mecanismos que ajudam a psique a se proteger e satisfa-
zer, pois procuram o equilíbrio tanto somático quanto psicológico;
e permitem ao indivíduo dormir, tendo em vista que são uma
forma de canalizar desejos insatisfeitos sem atiçar o corpo físico.
“Um sonho se desenvolve para satisfazer necessidades específicas,
mesmo que não sejam claros em seu conteúdo”, finaliza.