Da família de Stalin, praticamente ninguém foi capaz de ter
influência sobre ele. De temperamento forte, seria conhecido mais
por sua dedicação à política e ao partido do que por suas relações
pessoais – pais, esposas e filhos. Mesmo assim, convém dissertar
a respeito da relação que o todo-poderoso da União Soviética,
depois da morte de Lênin, estabeleceu desde jovem com sua mãe.
A filha de Stalin disse, certa vez, a respeito do pai e a avó o
seguinte: “Ele era um mau filho, negligente, exatamente como
era como pai e marido. Todo seu ser estava voltado para outra
coisa, a política e a luta, de modo que as pessoas que não estavam
próximas em caráter pessoal sempre foram consideradas mais
importantes para ele do que as que eram de seu convívio pessoal”.
De fato, Stalin era mais voltado ao partido do que à família.
Reclamações quanto à sua ausência em casa seriam corriqueiras
entre suas duas esposas. A mãe não reclamava, pois cedo
aprendera a ficar longe do filho. Primeiramente, quando foi
estudar no seminário, em seguida com o envolvimento na política
e, depois, nos dez anos entre as revoluções de 1905-07 e 1917,
quando Stalin viveu intercalando a vida na clandestinidade e nas
prisões. Nesse período, Ekaterina Georgievna Djugashvili ficou
até mesmo sem ter notícias do filho.
Pouco se encontraram depois da primavera de 1904, quando
passaram juntos algumas semanas em Gori. A partir de 1922, já com
grande destaque no partido e no governo, Stalin mudou sua mãe de
Gori para Tbilissi, a capital do Cáucaso. Ela foi instalada num antigo
palacete da cidade, onde ocupou um pequeno compartimento. Daí
em diante, passou a se comunicar com o filho mais por cartas, ditadas
para pessoas do partido que iam da cidade para Moscou.
Nos arquivos soviéticos divulgados em 1990, foram encontradas
cartas recebidas do filho que ela guardava com todo cuidado. De
1922 até sua morte, em 1937, foram 18 cartas. Algumas delas não
passavam de duas linhas, como a de 1o de janeiro de 1923, que dizia
assim: “Querida mamãe! Saudações! Que você possa viver dez mil
anos. Mando-te um beijo. O seu Soso”.
giano. Essa “russificação” imposta pelo governo causa-
ria diversas confusões na Geórgia, e mesmo Stalin iria
se especializar na questão quando no partido bolche-
vique. A questão das minorias nacionais seria o tema
pelo qual ficaria conhecido no círculo comunista no
início do século 20.
O cotidiano no seminário, onde permaneceu até ser
expulso em 1899, era monástico. Viviam trancados, mui-
tos empilhados em um único quarto, tendo aulas de teo-
logia e escolástica e fazendo orações, além de só poder
ler a literatura autorizada pela instituição. Um ex-estu-
dante afirmou que se sentiam como “prisioneiros que ali
devem passar anos, mesmo sem ter culpa de nada. Todos
nós éramos sombrios e taciturnos. (...) a alegria juvenil
quase nunca se afirmava”. Mesmo assim, a oposição polí-
tica era cultivada pelos alunos no seminário. Dali saíram
muitos dos homens que iriam lutar contra o regime cza-
rista nos próximos anos.
Stalin passou a ter maior contato com a literatura,
Junto com as cartas, Ekaterina enviava doces e geleias ao filho,
que retribuía com algum dinheiro e bilhetes curtos como o citado
acima. Apesar de ausente, Stalin rodeava a mãe dos melhores
cuidados. Tinha moradia, era atendida pelos mais competentes
médicos e, de vez em quando, recebia a visita dos netos. Em
compensação, numa dessas visitas, Svetlana Alliluyena, filha de
Stalin, se questionou do porquê da pobreza e da pequenez do
quarto em que a avó morava.
Na década de 1930, a saúde da mãe do camarada Stalin começou
a definhar. Em outubro de 1935, ele, enfim, quebrou um hiato de
muitos anos e visitou a mãe. Passou o dia com ela e voltou para
Moscou na mesma noite. Nesse encontro, que seria o último entre
eles, Ekaterina teria perguntado ao filho o que ele era realmente
no país. Ela tinha noção de que era importante, mas não do
grau de hierarquia a que chegara. Stalin teria respondido a ela o
seguinte: “Mamãe, lembra-se do nosso czar? Pois
bem, sou mais ou menos como ele”. Quando se despediram,
Ekaterina teria dito: “Ainda assim, é uma pena que não
tenha se tornado padre”.
No final de maio de 1937, ela contraiu pneumonia. Poucos dias
depois, em 4 de junho, acabou morrendo. Stalin não foi a Tbilissi
e não esteve presente no enterro da mãe. Alguns diziam que fez
isso por receio da reação popular contra o período de terror que a
União Soviética vivia, de perseguições e fuzilamentos sumários a
“traidores” e espiões. Outros apontam justamente esse cenário de
preocupação com as perseguições para sua ausência. O trabalho,
como ele sempre demonstrou, viria em primeiro lugar, acima
mesmo da mãe e de sua família.
Deu ordens para que a morte de Ekaterina não fosse noticiada
pela imprensa central, mas no Cáucaso saíram fotos dela nos
jornais, e as autoridades georgianas reservaram três dias para
as despedidas. Entre as milhares de coroas de flores, um grande
arranjo com um bilhete se destacava. Os dizeres eram: “Para
minha querida e amada mãe, de seu filho Josef Djugashvili”.
tendo mesmo publicado em 1895 um poema num peri-
ódico chamado “Iberia”. Pegava livros de uma biblioteca
da cidade, que eram proibidos pelo seminário e, muitas
vezes, acabavam confiscados pelos monges, como certa
vez foi “Os Trabalhadores do Mar”, de Victor Hugo. Sta-
lin lia Hugo e, principalmente, os russos Tchekhov, Go-
gol e Saltikov-Chtchedrin. Além destes, de fundamental
importância foram as leituras sobre biologia darwiniana,
economia e sociologia.
Ao que parece, quando Stalin ingressou no seminário,
aos 15 anos, em outubro de 1894, havia no futuro ditador
russo nada além de uma semente rebelde, brotada das in-
justiças sociais vividas por ele e observadas na escola, e um
sentimento patriótico georgiano. Sua discrição em relação
a tais ideias quando ainda em Gori possibilitaria a ida ao
seminário, e seria ali que entraria em contato com marxis-
tas e com a doutrina socialista. Contraditoriamente, foi
num ambiente de formação religiosa que Stalin forjaria
sua personalidade política de revolucionário.
A mãe do camarada Stalin