Claudia - Edição 696 (2019-09)

(Antfer) #1

96 claudia.com.br setembro 2019


Entrevista


uma diferença entre isso e não ter
arrependimentos. Existe um monte
de coisas que a gente gostaria de fazer,
conquistar para si mesma, mas que
não consegue resolver. Eu me can-
didatei a cargos públicos duas vezes
e não sinto arrependimento porque
pelo menos tentei.

O que você tirou da experiência
de palestrar no TED que deu origem
ao livro? Você a usou como uma
virada na carreira? Isso deu mais
coragem a você?
Eu vivo nesse movimento de exercitar
a minha coragem. Sempre digo que co-
ragem é como um músculo que precisa
estar constantemente em movimento.
Não é assim: “Ah, ok, agora eu sou
corajosa, estou pronta”. Não! Eu me
vejo muitas vezes voltando para antigos
comportamentos, especialmente como
mãe, sentindo que vou ser julgada por
essa ou aquela razão. A mesma coisa
como CEO, como líder, com amigos.
Esse é um ruído constante, e não só na
minha mente. Vivo conversando com
mulheres que também têm esse com-
portamento e vivem se questionando:
“Por que eu faço isso?”.

Como podemos começar
a ser corajosas agora?
Minha ideia é que a gente não pode
ser corajosa se estiver cansada, e
toda mulher que eu conheço está
exausta. A gente tem que descansar
e não se sentir culpada por isso. Vale
simplesmente dormir, fazer uma

mais feliz. Vejo tantas mulheres que se
mantêm em empregos que elas apenas
acham ok, mas não amam. Também
permanecem em relacionamentos
sem se sentirem felizes, têm hobbies
ou atividades que até gostariam de
fazer, mas não se jogam por achar
que não são boas o suficiente. Quando
você deixa a perfeição ir embora, re-
conecta sua mente à coragem, e isso
leva à felicidade.

Em Corajosa Sim, Perfeita Não,
você apresenta exemplos
seus e de outras mulheres...
Sim. Não importa se estou falando
com mulheres do Brasil, da Inglaterra,
da Índia, dos Estados Unidos; se são
mulheres mais velhas, mais novas, ricas
ou pobres... Essa é uma experiência
vivida por muitas de nós e que está
nos levando à ansiedade e à tristeza. E
também está contribuindo para uma
lacuna na liderança feminina. É algo
que a gente vê acontecer muito no nosso
dia a dia. A maioria das mulheres que
conheço fica com medo de fazer uma
pergunta em uma reunião, a não ser
que a questão seja perfeita. Elas não vão
levantar a mão para aquela promoção
porque acham que deveriam saber
executar as funções do novo cargo
perfeitamente. Também temos a culpa
da mãe, que se julga porque o filho não
está com a roupa perfeita ou porque ela
não preparou com as próprias mãos
os cookies para a festa de aniversário
dele. As mulheres constatam que são
constantemente julgadas de todas
as maneiras, sentem que precisam
executar tudo na totalidade.

Uma mulher que não é preocupada
com a perfeição é mais feliz?
Ela é mais feliz e está fazendo es-
colhas relativas à própria vida. Isso
não significa que vai alcançar sempre
tudo o que quer. Acredito que haja

“Sempre digo que coragem é como um músculo,
precisa estar constantemente em movimento. Mas
a gente não pode ser corajosa se estiver cansada,
e toda mulher que conheço está exausta”

caminhada, desligar o celular, o que
for bom para se sentir energizada. É
muito importante achar espaço para
si mesma sem se sentir egoísta. E a
segunda coisa é realmente praticar essa
imperfeição. Por exemplo, você não
precisa ir à padaria toda produzida e
maquiada. São essas pequenas ações
que preparam o músculo da coragem,
que colaboram para estar pronta na
hora de subir a um palco.

Você tem algum mantra?
Sim. Corajosa, sim; perfeita, não.

O que devemos falar para
nós mesmas quando sentimos
que estamos indo para o
lado da perfeição?
Primeiro, anime-se, reconheça que
é uma jornada, que a coragem é um
músculo, que está tudo bem se você
relaxar. Certa vez, eu estava no avião
com minha família. Resolvi dar meu
bilhete de primeira classe para meu
marido porque sabia que ele estava
exausto havia meses. Sentei atrás
com meu filho e, em certo momento,
o pequeno começou a jogar M&M
em mim. Procurei meu marido e o vi
tomando uma taça de vinho, relaxado.
Olhei para minha situação e disse pra
mim mesma: “A-ha! Então essa sou
eu sendo mãe!”. Depois disso não tive
dúvidas e falei pra ele: “Vamos trocar
de assentos agora”. Então tudo bem
corrigir-se quando você se dá conta
do seu comportamento. Precisa con-
tinuar tentando sempre.
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