Elle - Portugal - Edição 374 (2019-11)

(Antfer) #1
L

coisas como bolsos que efetivamente servem
para guardar coisas, ou trocando carteiras
por mochilas. Não nos interprete mal, não
estamos a dizer que existe algo de errado
em querer andar com uma Saddle da Dior
na mão o dia inteiro, não, estamos antes a
dizer “que bom!”, existe oferta para todos os
gostos (até porque a pluralidade é sempre algo positivo).
Criar algo prático e útil não tem necessariamente que ver
com peças como o macacão azul de bolsos na frente usado
por Rosie the Riveter, por isso, as primeiras notas de que
esta forma de pensar estaria a introduzir-se na secção de
vestuário de dia a dia começaram a surgir em torno dos anos
de 2016/17. Nesta altura uma série de acontecimentos fez a
sociedade pensar que os seus direitos estariam a ser postos em
causa (como, por exemplo, o Brexit, as acusações de Harvey
Weinstein e o aparecimento do movimento #MeToo, e as
eleições norte-americanas que tornaram Donald Trump o
45º Presidente do país), levando as pessoas para as ruas em
protestos e manifestações, e fazendo-as entender que até
mesmo no que à roupa diz respeito, era necessário algo que
de certa forma lhes desse uma maior liberdade. Foi assim que
surgiram então as fanny packs e os ugly sneakers, pelos quais
todos se apaixonaram perdidamente. Sabemos que isto, dito
assim, pode até parecer um pouco sem nexo, afinal de contas,
não terão eles retornado apenas porque os anos 90 estavam a
voltar a influenciar as coleções dos designers? Talvez tenha
ajudado, sim, mas na verdade, por se tratarem de peças mais
práticas (e até mesmo confortáveis), que efetivamente dão
mais liberdade a quem as usa, podemos considerar que são
antes um reflexo deste espírito da sociedade.
Estas duas peças marcaram o início de tudo. Desde então,
a indústria da moda tem espelhado cada vez mais intensa-
mente esta nova forma de pensar coletiva. Na primavera/
verão 2018 tivemos, por exemplo, o retorno do camuflado
e do estilo militar (que por estar associado a um estilo de
vida muito específico, é sempre mais pragmático) que se fez
notar nas coleções de primavera/verão 2018 de marcas como
Jeremy Scott, em que não faltaram camisolas, casacos, calças
e até mesmo saias com este padrão; Junya Watanabe, onde,
em alguns dos looks, a designer cobriu as modelos neste
estampado dos pés à cabeça; e até mesmo da Dior, em que
Maria Grazia Chiuri fez percorrer pela passerelle looks que
pareciam estar prontos para ir para a guerra. Já no outono/
inverno 2018/19, este desejo de mudança se fez notar através
do retorno massivo dos coordenados em pele. Claro que se
trata de um tecido um pouco mais restritivo, mas que traz
consigo uma mensagem clara de poder, de afirmação, de “eu
quero isto, e ponto final”, e isso traduziu-se em peças mais
simples, e adaptadas ao dia a dia de cada um (tendo ficado
bem claro nos desfiles de marcas como a Hermès ou a Alexan-


der McQueen). Na estação seguinte foram os bolsos que se
“juntaram à festa” (permita-nos a expressão). E não estamos
a falar só de bolsos maiores nas calças, não, estamos a falar
na aplicação de bolsos nos mais variados tipos de acessórios e
peças de vestuário. Aliás, basta-nos recordar o desfile de marca
Marine Serre, vencedora do Prémio LVMH em 2017, para nos
virem à cabeça imagens de peças cobertas (literalmente) por
dezenas e dezenas de bolsos nas mais variadas formas e feitios.
Todas estas ligeiras introduções que se foram fazendo
criaram um efeito bola de neve, e como resultado final ti-
vemos então a condecoração do utilitarismo na indústria da
moda com o título de tendência para esta estação fria. Como
resultado, e somando a todos os pontos falados anteriormente,
as coleções tornaram-se mais simples, com linhas mais de-
puradas, e mais pensadas para o utilizador (e, já agora, com
bolsos, mas não em exagero). Um perfeito exemplo disso foi
a coleção da Balenciaga, desenhada por Demna Gvasalia (que
recentemente anunciou a sua partida da Vetements) que se
tornou mais pragmática, sem grandes exageros, e com uma
série de fatos e de peças inspiradas em fatos. Mas o que seria
feito de uma coleção que preza tanto o lado prático como o
estético sem um macacão? Claro que existiriam jumpsuits
nas linhas de vários (ênfase em vários) designers, como foi o
caso do modelo verde usado poe Kaia Gerber no desfile de
Stella McCartney. Claro que não foi só esta peça que marcou
presença, aliás, foram poucas as vezes que a vimos percorrer a
passerelle, já que a designer optou por a trocar por gabardines.
Também na apresentação da Max Mara, esta mudança
ficou clara. Ainda que tenha sempre apostado na questão da
praticidade da roupa, nesta estação elevou a fasquia.

NOQUEÀROUPADIZRESPEITO,
ERANECESSÁRIOALGOQUE
DE CERTA FORMA NOS
DESSE MAIOR LIBERDADE.

FENDI

STELLA MCCARTNEYMAX MARA

COACH
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