CARLOS ALBERTO SARDENBERG Caindo no ridículo
Banco Central do Brasil
Jornal O Globo/Nacional - Opinião
sábado, 28 de maio de 2022
Cenário Político-Econômico - Colunistas
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Inflação alta é culpa do governo. Vale aqui e no mundo
todo. Mesmo quando preços sobem independentemente
da ação (ou inação) do governo, a culpa continua sendo
dele. Alguns governantes reclamam. Tentam justificar: a
gasolina subiu por causa da Rússia; trigo em alta,
também consequência da guerra. A resposta da
população ao governante seria mais ou menos assim: E
daí? Vire-se.
Nesta semana, foi anunciado um reajuste de 15, 5% nos
planos de saúde individuais, afetando o orçamento de 8
milhões de pessoas. Na planilha, o reajuste até faz
sentido. O valor da mensalidade havia caído mais de
8% em 2021, de modo que, considerando os dois anos,
o último reajuste fica em torno de 3%, abaixo da
inflação. Além disso, a inflação médica continua
acelerada e acima da média dos demais preços. Ok,
mas o segurado receberá o boleto com alta de 15, 5%
em relação ao mês anterior - isso em cima de altas
fortes dos combustíveis e dos alimentos, para ficar em
itens essenciais. E o governo não vai fazer nada?
Aqui está a segunda questão: as famílias sentem os
danos da inflação, mas também percebem o que o
governo está ou não fazendo para controlar o problema.
Por exemplo: brigar com a Petrobras e trocar seu
presidente não adiantou nada para Bolsonaro, como a
pesquisa Datafolha mostrou muito claramente. Pôr a
culpa nos governadores, pelos impostos elevados,
também não funcionou. Se o preço dos combustíveis
não caiu, isso revela a incompetência do governo, tal é
a percepção da população.
Nem mesmo o Auxílio Brasil turbinado, de R$400,
melhorou a posição do presidente. Os beneficiários dão
essa renda por consumada - e isso desde que Lula
lançou o Bolsa Família.
No Congresso, lideranças tentam uma resposta
concreta. Conforme Projeto de Lei aprovado na Câmara
e agora tramitando no Senado, os governos estaduais
teriam de limitar a 17% o ICMS sobre combustíveis e
outros itens essenciais, como energia elétrica. Como os
estados cobram mais que isso (35% no Rio de Janeiro,
na gasolina!), é óbvio que o preço final cairá. Se
aplicada já, a regra tiraria 1, 5% da inflação deste ano. A
previsão do mercado está em torno de 8% para mais.
Seria um dado importante, mas reparem: se o preço da
gasolina cair por causa da alíquota de ICMS reduzida, o
alívio durará até que a Petrobras anuncie seu próximo
aumento. Além disso, a arrecadação dos estados e
municípios sofrerá forte baque, com a consequente
redução de investimentos e serviços públicos. Em
resumo, se trocará um alívio momentâneo por um dano
duradouro.
A alta de preços é a parte mais visível da situação
econômica. Mas por trás de tudo há uma gestão
desastrosa. Nem há respostas imediatas, nem políticas
de médio prazo. Para o preço dos combustíveis, uma
saída provisória seria subsidiar diretamente, com
dinheiro do governo federal, os setores sociais mais
prejudicados. Já se falou num fundo de estabilização de
preços - também formado com recursos federais -, mas
o governo teria de ser minimamente competente para
montar esses instrumentos.