Vingança a Sangue-Frio

(Carla ScalaEjcveS) #1

estávamos habituados. Não parece estar a acreditar em mim.


Harry encolheu os ombros. Raskol cruzou os braços.
– Em 1589, a Dinamarca introduziu a pena de morte para os chefes tribais
ciganos – disse. – Cinquenta anos depois os suecos decidiram que todos os
ciganos, homens, deviam ser enforcados. Na Morávia, cortam a orelha
esquerda às mulheres ciganas e na Boémia a direita. O arcebispo de Mainz
proclamou que todos os ciganos deviam ser executados sem sentença, pois o
seu modo de vida também se encontrava fora da lei. Em 1725, foi aprovada
uma lei na Prússia que dizia que todos os ciganos com mais de dezoito anos
deviam ser executados sem julgamento, mas, mais tarde, foi feito um apelo a
esta lei; o limite de idade desceu para os catorze anos. Quatro dos irmãos do
meu pai morreram em cativeiro. Só um deles morreu durante a guerra. Devo
continuar?


Harry assentiu.
– Mas até isso é um círculo fechado – disse Raskol. – O motivo por que
somos perseguidos e sobrevivemos é o mesmo. Nós somos, e queremos ser,
diferentes. Da mesma maneira que somos mantidos à margem, também os
gadjos não podem entrar na nossa comunidade. O cigano é um desconhecido
misterioso e ameaçador a respeito do qual nada se sabe, mas acerca do qual
existem todo o tipo de rumores. Pessoas ao longo de muitas gerações
acreditaram que os ciganos eram canibais. Onde eu cresci, em Balteni no
exterior de Bucareste, afirmavam que éramos descendentes de Caim e
amaldiçoados à perdição eterna. Os nossos vizinhos gadjo davam-nos
dinheiro para nos mantermos afastados.


Os olhos de Raskol esvoaçaram pelas paredes sem janelas.
– O meu pai era ferreiro, mas não havia trabalho na Roménia. Tivemos de
sair do aterro de lixo no exterior da cidade, onde os ciganos Kalderash
viviam. Na Albânia, o meu pai era o bulibas , o líder e árbitro cigano local,
mas entre os Kalderash era apenas um ferreiro desempregado.


Raskol soltou um suspiro profundo.
– Nunca mais me vou esquecer da expressão dos seus olhos quando trouxe
para casa um urso pequeno e domesticado. Comprara-o com o último dinheiro
que tinha a um grupo de Ursari. «Sabe dançar», disse o meu pai. Os
comunistas pagavam para ver um urso dançar. Fazia-os sentirem-se melhor
em relação a si mesmos. Stefan, o meu irmão, tentou alimentar o urso mas ele
não comia, e a minha mãe perguntou se ele estava doente. O meu pai
respondeu que tinham vindo a pé desde Bucareste e só precisavam de

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