Bateu com o coldre em cima da mesa.
Harry recostou-se na cadeira e fechou os olhos até ouvir a respiração
acelerada de Beate a acalmar.
– A questão é aquilo que é suficientemente moral para ti, Beate. Não sei
porque tens a tua arma contigo, e não tenho qualquer intenção de te impedir
de fazeres aquilo que quiseres.
Levantou-se.
– Deixa o teu pai orgulhoso, Beate.
Ao pousar a mão na maçaneta, ouviu Beate a soluçar. Virou-se.
– Não compreendes! – soluçou ela. – Eu pensei que podia... pensei que
fosse uma espécie de... de uma conta a ajustar.
Harry permaneceu imóvel. Depois aproximou a cadeira dela, sentou-se e
pousou-lhe uma mão na face. As lágrimas de Beate eram quentes e rolaram
sobre a mão áspera de Harry, enquanto ela continuava a falar.
– Juntamo-nos à polícia porque temos a ideia de que tem de existir uma
ordem, um equilíbrio nas coisas, não é verdade? Um juízo, justiça e todas
essas coisas. E depois um dia surge-nos a oportunidade pela qual sempre
esperámos, a de ajustar contas. Apenas para descobrirmos que afinal não era
isso que queríamos. – Fungou. – A minha mãe disse-me uma vez que há
apenas uma coisa pior do que não satisfazer um desejo. E essa é não sentir
qualquer desejo. Ódio... apenas isso nos resta quando perdemos tudo. E
depois até isso nos é tirado.
Empurrou o coldre pela mesa com o braço. Aquele embateu contra a
parede.
A escuridão era total quando Harry parou na avenida Sophies à procura de
um bolso do casaco mais familiar para as suas chaves. Uma das primeiras
coisas que fizera naquela manhã no Quartel-general da Polícia fora ir buscar a
sua roupa à Krimteknisk , para onde tinham sido levadas da casa de Vigdis
Albu. Mas a primeira coisa fora ir ao gabinete de Bjarne Møller. O chefe da
Brigada de Homicídios dissera que naquilo que se referia a Harry parecia
estar tudo bem, mas teriam de esperar para ver se alguém reportava um
arrombamento na Harelabben 16. Durante o dia saber-se-ia se iria haver
alguma investigação pelo facto de Harry ter retido informações relacionadas
com a sua presença no apartamento de Anna Bethsen, na noite do homicídio.