A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

centro que levava seu nome. Não, pensou, de repente. Não era bem verdade. O
restaurador também sabia dessa ligação.
Uma longa mesa retangular havia sido colocada em cima de uma plataforma elevada
em frente às janelas, e duzentas cadeiras tinham sido organizadas na sala aberta como
soldados em um desfile. Cada uma delas estava ocupada, e mais cerca de cem
espectadores se enfileiravam junto à parede do fundo. Hannah tomou seu devido lugar
— ela se oferecera para servir como uma barreira de separação entre Goldman e Strauss
— e ouviu Rachel Lévy instruir a plateia a silenciar seus celulares. Finalmente, chegou
sua vez de falar. Ela ligou o microfone e baixou os olhos para a primeira frase de seu
discurso. “É uma tragédia nacional que uma conferência como esta esteja
acontecendo...” E, então, ouviu o som na rua, um estalo como o estouro de bombinhas,
seguido de um homem gritando em árabe.
— Khaybar, Khaybar, ya-Yahud!
Hannah desceu da plataforma rapidamente em direção às janelas.
— Meu Deus — sussurrou.
Virando-se, ela gritou para os debatedores se afastarem das janelas, mas o estrondo
da detonação engoliu seu aviso. Instantaneamente, a sala virou um tornado em que
voavam vidro, cadeiras, alvenaria, roupas e membros humanos. Hannah percebeu que
estava tombando para a frente, mas não tinha noção se estava subindo ou caindo. Em
determinado momento, pensou ter vislumbrado Rachel Lévy girando como uma
bailarina. Depois, Rachel, e tudo o mais, se apagou.
Por fim, ela parou, talvez de costas, talvez de lado, talvez na rua, talvez em um
túmulo de tijolo e concreto. O silêncio era opressor. A fumaça e a poeira também. Ela
tentou tirar a areia dos olhos, mas seu braço direito não respondia. Então, Hannah
percebeu que não tinha braço direito. Parecia também não ter uma perna direita. Ela
virou um pouco a cabeça e viu um homem deitado ao seu lado.
— Professor Strauss, é você?
Mas o homem não disse nada. Estava morto. Logo, pensou Hannah, estarei morta
também.
De repente, ela ficou com um frio terrível. Supôs que fosse a perda de sangue. Ou,
talvez, o sopro de vento que clareou brevemente a fumaça negra na frente de seu rosto.
Percebeu, então, que ela e o homem que podia ser o professor Strauss estavam deitados
juntos em meio aos escombros na rue des Rosiers. E, parada acima deles, olhando
através do cano de um rifle automático de estilo militar, estava uma figura vestida toda de
preto. Uma balaclava cobria seu rosto, mas os olhos estavam visíveis. Eram
impressionantemente belos, dois caleidoscópios de castanho e cobre.
— Por favor — disse Hannah, suavemente, mas os olhos atrás da máscara apenas
brilharam com ardor.
Então, houve um flash de luz branca, e Hannah se viu caminhando por um corredor,
com seus membros que havia perdido restaurados. Ela passou pela porta de seu quarto

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