A Viúva Negra

(Carla ScalaEjcveS) #1

— Gabriel Allon, enfim — os pequenos olhos negros de Fareed brilhavam como
ônix polido. O nariz era como o bico de uma ave de rapina. — Que bom finalmente
conhecê-lo. Depois de ler aquelas histórias sobre você no jornal, eu me convenci de que
tinha perdido minha chance.
— Repórteres — disse Gabriel, com desdém.
— De fato — concordou Fareed. — É sua primeira visita à Jordânia?
— Infelizmente, sim.
— Nada de visitas secretas a Amã com passaporte emprestado? Nem operações
contra um de seus muitos inimigos?
— Eu nem sonharia com isso.
— Sábio — disse Fareed, sorrindo. — É melhor jogar conforme as regras. Você
descobrirá em breve que posso ser muito útil.
Israel e Jordânia tinham mais em comum que uma fronteira e um passado colonial
britânico. Ambos eram países ocidentalizados tentando sobreviver num Oriente Médio
que estava saindo perigosamente de controle. Tinham lutado duas guerras, em 1948 e
1967, mas formalmente feito as pazes após os acordos de paz de Oslo. Mesmo antes disso,
porém, o Escritório e o DGI mantinham laços estreitos, ainda que cautelosos. A
Jordânia universalmente era considerada o mais frágil dos Estados árabes, e o trabalho
do DGI era manter a cabeça do rei nos ombros e o caos da região à distância. Israel
queria a mesma coisa, e o DGI encontrara um parceiro de negócios competente e
confiável. O DGI era um pouco mais civilizado que seus colegas iraquianos e egípcios,
mas não por isso menos ubíquo. Uma vasta rede de informantes vigiava o povo
jordaniano e monitorava todas as suas palavras e todos os seus atos. Até um comentário
isolado cruel sobre o rei ou sua família podia resultar em uma estadia de duração
indeterminada no labirinto de centros de detenção secretos do DGI.
Uzi Navot avisara Gabriel sobre os rituais que acompanhavam qualquer visita ao
covil banhado a ouro de Fareed: as infindáveis xícaras de café árabe doce demais; os
cigarros; as longas histórias sobre as muitas conquistas de Fareed, tanto profissionais
quanto românticas. Fareed sempre falava como se não conseguisse acreditar na própria
sorte, o que só aumentava seu considerável charme. Se alguns homens se abatiam com o
peso da responsabilidade, Fareed prosperava. Era o senhor de um vasto império de
segredos. Era um homem profundamente satisfeito.
Durante todo o monólogo de Fareed, Gabriel conseguiu manter firme no rosto um
sorriso plácido e atento. Riu nos momentos certos e fez uma ou duas perguntas, mas o
tempo todo seus pensamentos vagavam para as fotografias contidas na maleta de aço
inoxidável trancada que descansava a seus pés. Ele nunca antes carregara uma maleta —
pelo menos não intencionalmente, mas só por disfarce. Parecia um grilhão, uma âncora.
Talvez devesse achar alguém que a carregasse para ele. Mas, por dentro, temia que isso
pudesse criar em si um gosto por privilégios, o que, inevitavelmente, levaria a um
manobrista, um degustador de comida e um horário regular em um cabeleireiro de Tel
Aviv. Já sentia falta da pequena emoção de dirigir seu próprio carro pelas pistas

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