ANJO CAÍDO

(Carla ScalaEjcveS) #1

Ela desligou a televisão em silêncio e levou as taças de vinho para a sala de estar. Na
mesinha de centro, havia uma bandeja de bruschettas. Chiara observou Gabriel comendo uma
coberta de corações de alcachofra e ricota e tomando um bom gole de Sangiovese. Seus olhos,
grandes e amendoados, tinham cor de caramelo salpicado com ouro. O tom tendia a mudar de
acordo com o humor de Chiara. Gabriel pôde ver que a esposa estava inquieta. E ela tinha
motivos para isso. A última missão deles para o Escritório, uma operação contra uma rede de
terroristas jihadistas, fora particularmente violenta e terminara no Empty Quarter, na Arábia
Saudita. Chiara tivera esperanças de que a restauração do Caravaggio fosse a última etapa da
longa e difícil recuperação de Gabriel, o começo de uma nova vida, fora da órbita do
Escritório. E não devia incluir uma investigação conduzida em nome do secretário pessoal do
papa.
— E então? — perguntou ela.
— Estava deliciosa — respondeu Gabriel.
— Eu não estava falando da bruschetta. — Chiara arrumou as almofadas no canto do
sofá. Ela sempre organizava coisas quando estava irritada. — Você já pensou no que o serviço
de segurança italiano vai fazer se descobrirem que você trabalha como freelance para o
Vaticano? Eles vão nos expulsar do país. De novo.
— Eu tentei explicar isso para Donati.
-E?
— Ele invocou o nome de seu mestre.
— Ele não é o seu papa, Gabriel.
— O que eu podia dizer?
— Encontre outra pessoa — sugeriu ela. — São três belas palavras que você precisa
aprender.
— Você não diria isso se tivesse visto o cadáver de Claudia.
— Isso é golpe baixo.
— Mas é verdade. Eu vi muitos cadáveres na minha vida, mas nunca um que tivesse
caído mais de 40 metros, se chocando contra um chão de mármore.
— Que jeito terrível de morrer. — Chiara contemplou a chuva caindo sobre o pequeno
terraço com vista para a Escadaria Espanhola. — Você tem certeza de que Donati falou a
verdade?
— Sobre o quê?
— Sobre o relacionamento dele com Claudia Andreatti.
— Você quer saber se eu acho que eles tinham um relacionamento amoroso? Não.
— Você cresceu sem saber o que aconteceu com sua mãe durante a guerra, pois ela não
contou nada.
— O que isso tem a ver?
— Todo mundo guarda segredos. Até das pessoas em que mais confiam. Pode chamar
de intuição feminina, mas eu sempre senti algo estranho em relação ao monsenhor Donati. Ele
tem um passado oculto. Tenho certeza disso.
— Todos temos um passado.

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