Eu e as Mulheres da Minha Vida

(Carla ScalaEjcveS) #1

OITO


No dia seguinte Zé acordou inexplicavelmente deprimido, com mau humor e irritadiço.
Despertara com a cabeça a latejar e a boca seca. Talvez fosse porque bebera e fumara
demasiado na noite anterior e por se ter deitado mais tarde do que o costume e ter dormido
pouco. Talvez fosse por descobrir, ao encontrar-se consigo no espelho da casa de banho, que
afinal, por mais promoções que lhe oferecessem, não voltaria a ser a sombra do que havia sido
na juventude. Mas, provavelmente, a razão do seu deplorável estado de espírito era o resultado
da soma de todos estes factores.
E se não fosse nada disto? E se fosse algo muito mais grave, que ele não estava preparado
para admitir? Vejamos: quanto tempo gastara ele a sonhar com a Bellucci? Quantas vezes
dissera para si, em voz alta, «não vejo a hora de ir para a cama com ela»? Demasiadas.
Sejamos francos, Zé tinha uma vozinha dentro dele que lhe gritava a todo momento: «EU QUERO
COMER A BELLUCCI!!!!!!!» Pois bem, agora que já o tinha feito, não era verdade que sentia um
certo vazio dentro de si, como se não houvesse mais nada para conquistar? Porque, afinal de
contas era disso que se tratava, ou não? De conquistar. Um homem andava dias a fio obcecado
por uma mulher, antecipando aquele momento em que ela finalmente cedia aos seus avanços,
magicando estratégias de encantar, fantasiando encontros explosivos nos locais mais obscuros
— casas de banho públicas, debaixo (ou em cima) da secretária quando o escritório estivesse
vazio e por aí fora — e, depois de algo assim acontecer, o que é que restava? Mais do mesmo?
Era como aquela chatice de, depois de fazer amor com uma mulher, um tipo ter de continuar na
cama, abraçadinho a ela e a fingir que namorava e que gostava muito dela, só para não aturar os
amuos da mulher o resto do dia.
Chegou ao banco às nove. Arrumou o carro na garagem subterrânea — mais uma experiência
nova —, onde se encontrou com o ex-chefe. Subiram juntos no elevador.
— Bom dia, Figueiredo.
— Bom dia, Pereira.
— Parabéns pela promoção.
— Obrigado, Pereira. — Deu-lhe gozo trocar o habitual «chefe», por um «Pereira» bem mais
informal. O homem já não o podia prejudicar, pelo menos directamente.
Abriu o computador e descobriu uma mensagem:
Gostei muito de ontem à noite.
Apagou a mensagem e não respondeu. Passou a manhã a estudar as suas novas funções,
assistido por uma ultra-eficiente secretária, de nome Lisete. Ela vestia um elegante conjunto
saia-casaco, o que lhe pareceu refrescante — hoje em dia, era raro ver uma mulher a trabalhar
de saia, parecia que usar calças era uma atitude deliberada, como se fizesse parte de um
uniforme feminista — e que, a propósito, não estava nada mal. Lisete usava uns modernos

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