por lhe apaziguar o azedume aos jornalistas —, o meu telefonema não tem
quaisquer propósitos informativos, não é, de modo algum, matéria noticiosa.
Quero apenas saber o que devo responder a uma mulher desesperada que não
me larga o telefone.
— Hum... — resmungou o camarada comandante. — Estamos a falar no
âmbito do off the record?
— Absolutamente.
— Então, amigo Patrício, não se esqueça de que vou considerá-lo
pessoalmente responsável se o off virar record.
— Compreendo. — Não precisava de ouvir a mesma ameaça duas vezes.
Aquele tipo costumava ser simpático com ele, mas quando lhe davam os
azeites fazia ameaças de morte. E, se estivesse realmente irritado, cumpria-as.
O comandante distraiu-se com um assunto qualquer de trabalho. Patrício
ouviu-o falar para o lado e esperou que ele lhe desse atenção.
— Patrício — disse, finalmente, voltando ao telefone —, diga a essa mulher
que pode parar de telefonar, porque o homem dela era um agente da UNITA e
você sabe o que acontece a esses gajos, traidores do povo angolano. O avião
dele explodiu no aeroporto, carregado de armas, e a essa cobra já lhe
cortámos a cabeça.
Quando desligou o telefone, Patrício pingava suor como se estivesse numa
sauna. Tinha a camisa colada às costas de napa da cadeira e só conseguiu
controlar os vómitos durante os cinco segundos que demorou a sair da
redacção sem estragar a compostura e a chegar à casa de banho. Fechou-se
num cubículo e despejou na sanita tudo o que lhe revolvia o estômago: o
almoço, o terror, o nojo.
Enxaguou o rosto com água fria, voltou para a sua secretária com as pernas
a tremerem. O Monstro Imortal era a sua melhor fonte dentro do MPLA, sem
dúvida. Patrício gozava o duvidoso privilégio de ter linha directa com ele,
mas isso não lhe dava o direito de fazer as perguntas erradas. Em boa verdade,
aquela relação era como andar em cima do arame e, desta vez, ele estivera
muito perto de se desequilibrar. Em breve, apenas um ano e meio mais tarde,
essa sua linha directa com o comandante revelar-se-ia fatal para Patrício, pois
seria motivo mais do que suficiente para o regime lhe passar, e executar, uma
sentença de morte.