O Último Ano em Luanda

(Carla ScalaEjcveS) #1

unidades de caça que perseguiam os guerrilheiros nas profundezas
insondáveis das matas, enxotando-os e desbaratando-os; e dali partiam as
segundas equipas que aguardavam o sinal das primeiras para entrarem nos
helicópteros e caírem em cima do inimigo em fuga e aniquilá-lo.


Hoje porém não havia comandos na unidade, aliás, à primeira vista até
parecia não haver ninguém. A chuva morna, que na última meia hora
aumentara de intensidade, levara toda a gente para as barracas. Em
contrapartida, do ar, Nuno registou uma movimentação alarmante fora do
perímetro militar.


Para fazer a manobra de aproximação à pista, Nuno precisaria de
ultrapassar a base, dar uma volta de 180 graus, alinhar-se com a faixa de terra
batida e aterrar. Antes de sobrevoar a base passou por uma área mais aberta,
com árvores dispersas que, progressivamente, iam formando um arvoredo
compacto, tornando-se finalmente na mata densa que desembocava na clareira
ocupada pela base militar. À esquerda do monomotor, afastada cerca de um
quilómetro, Nuno avistou a aldeia indígena. Foi nesse momento que lhe
pareceu ver movimento entre as árvores. Limpou freneticamente a janela
lateral, embaciada por dentro e molhada por fora, num esforço para confirmar
a primeira impressão. Como não foi a tempo de o fazer, deu a volta e voou em
círculo sobre a área que lhe despertara a atenção. Ah, grande merda!, berrou
para ninguém em especial, a exteriorizar a sua frustração. Não acredito, disse
em voz alta, não acredito nesta merdaaa!! Nuno sentiu o coração disparar e os
nervos a tomarem conta de si.


Lá em baixo, um homem armado surgiu de debaixo de uma árvore, a
caminhar através do capim alto. Depois viu um segundo e outro e outro e
outro e depois já eram tantos, percorrendo em passo decidido os espaços
curtos entre as árvores, que deixou de os contar ou perdeu-lhes a conta ou,
simplesmente, calculou que deveriam ser quase meia centena de guerrilheiros,
todos armados e já muito perto da base. Agarrou-se ao rádio, chamou a base,
só obteve estática. Voltou a chamar e nada, o rádio não funcionava.
Provavelmente, tinha partido a antena ao atravessar a tempestade de granizo
dentro das nuvens. E sem antena estava impossibilitado de comunicar com
terra, não poderia dar o alerta, a não ser que aterrasse e.... não, nem pensar,
aterrar está fora de questão!
Nuno pensou que já tivera a sua dose para um
dia inteiro, qual dia, para uma semana, um mês inteiro! Sair vivo de um
cumulus-nimbus era obra, quer dizer, quantas das suas sete vidas teria gastado

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