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O fornecedor prometeu ao jovem à sua frente o ácido que ele pretendia e
mais algum, cheio de paciência para levar a conversa a bom porto.
— Concentra-te, pá — pediu-lhe.
— Tudo bem — respondeu o jovem. Abanou várias vezes a cabeça a dizer
que sim, embora revelasse óbvias dificuldades em manter uma conversa
coerente. Estava sentado no chão, encostado à parede, à porta do café na
Avenida de Roma que Nuno costumava frequentar. O fornecedor passara as
últimas horas a interrogar pessoas, a abordar caras que lhe pareciam
vagamente familiares, na esperança de que alguém o pudesse conduzir até
Nuno.
De cócoras diante do rapazinho perdido de bêbado que já lhe salpicara os
sapatos com vomitado, o fornecedor resistia heroicamente ao instinto
selvagem que o incitava a esganar o parvalhão sem contemplações. O sangue
fervia-lhe e sentia-se à beira de uma explosão de violência. Contudo, o
rapazinho tinha-se revelado a fonte mais prometedora da noite e o fornecedor
sabia que não podia permitir-se um ataque de mau génio e desperdiçar a sua
melhor hipótese de encontrar Nuno.
«Eu costumo comprar ao Nuno, mas o gajo hoje não apareceu e estou à
toa», dissera o jovem. O pior é que havia bebido vodka quase até à
inconsciência para compensar a privação da droga e agora não dizia coisa
com coisa. Olhou com um espanto lívido para o homem de cócoras à sua
frente e fez um esforço de concentração genuíno.
— Estavas a dizer-me — continuou o fornecedor — que o Nuno não
apareceu porque teve uma festa, certo?
— Hã?...
O fornecedor respirou fundo.
— O Nuno — repetiu — tinha uma festa, certo?
— Não sei, você é que disse que ele ia a uma festa.
— Certo, mas tu sabes onde é a festa, sabes quem é que dava a festa...
— Sim, bem, eu sei que havia uma festa hoje à noite, mas não sei se é a
mesma festa que o Nuno... ele ia a uma festa?
— Sim, ele ia a uma festa. Mas esquece isso, diz-me só quem é o tipo que