— O quê?
— Com essa tanga do destino!
— Nunca te aconteceu passar-se alguma coisa na tua vida que tu não consegues controlar? —
Cristiane soprou como um balão a esvaziar-se. Estava quase a perder as estribeiras. — Não, a sério
— insistiu João Pedro —, não há coisas na tua vida que não consegues controlar?
Ela abanou a cabeça, perplexa.
— João Pedro, tu achas que eu sou parva?
— Claro que não.
— Por acaso passa-te pela cabeça que eu engulo essa treta?
Ele olhou para ela muito sério, disse:
— Não é treta nenhuma, são os factos.
— Os factos é que a quiseste na inauguração e que me mentiste. Estes são os factos. Porque sentiste
necessidade de me mentir?
João Pedro encolheu os ombros.
— Porque, de qualquer maneira, se te dissesse a verdade tu pensarias que era mentira. Como
agora, achas que te estou a mentir. Cristiane, a Carol só foi lá trabalhar, a presença dela não teve
outro significado. Estás a dar demasiada importância ao assunto.
— Achas que estou?
— Estás.
— Então e o destino a empurrá-la para a tua vida não é nada sério?
O problema de lidar com Cristiane é que ela era muito inteligente e, num abrir e fechar de olhos,
estava a usar os argumentos de João Pedro contra ele próprio. Era uma situação complicada porque
não lhe podia dizer toda a verdade, mas também não tinha a habilidade de lhe mentir com a
credibilidade necessária para lhe apaziguar a descrença. Ora, João Pedro já vira o futuro, certo?
Sonhara com ele. Portanto, sabia que, mais dia, menos dia, haveria de ter Cristiane e Carol juntas nos
seus braços. Por isso, a zanga dela não o preocupava muito. Tal como lhe dissera, era o destino, não
havia como fugir-lhe. Mas como explicar isso a uma mulher astuta, que via o mundo com uma
assertividade aguda? Cristiane não acreditava que o destino das pessoas estivesse predefinido, ela
passara a vida inteira a definir o seu destino sem esses constrangimentos ocultos que, alegadamente,
escapariam ao controlo do ser humano. Considerava que esse género de pensamento era próprio de
gente ignorante e não se coadunava com uma pessoa culta como João Pedro. Não fazia sentido. De
modo que, quando João Pedro se embrulhou numa resposta atabalhoada sobre o advento de Carol na
sua vida não ter realmente importância, e que o que tivesse de acontecer aconteceria e não dependia
deles decidir o destino, Cristiane pôs os olhos nele, estupefacta, e explodiu de indignação.
— Tu és doido! — disse. — Tu não regulas bem, precisas de te tratar, sabes? Tens de ir a um
psiquiatra ra-pi-da-men-te.
E, dito isto, voltou-lhe as costas e saiu de casa dele. No dia seguinte, partiu para o Brasil.